Com mais de 190 mil mortos, o Brasil teima em não fechar negócio com os laboratórios que vendem o imunizante. Só pode ser capricho. Para o presidente Jair Bolsonaro, não. Ele diz que precisa de garantias porque as vacinas têm contraindicações. Ora, até Cibalena tem contraindicação. Mas não é este o ponto deste comentário, embora a pandemia tenha causado, aqui como em outras partes, um desastre tanto do ponto de vista sanitário como econômico. Cento e Noventa mil mortos e o governo a brincar com a morte.
Como a dizer que o Brasil é um grande mercado e que por isso mesmo deveria ser procurado pelos fabricantes de vacinas. Ora, não se trata aqui de mercado. Trata-se de saúde pública. São coisas absolutamente distintas, embora o governo não faça essa distinção.
De forma que o ano, que não quer terminar, como no livro de Zuenir Ventura – 1968, o ano que não quer terminar – começou mal e deve terminar pior ainda. A começar pelo número de vítimas da Covid-19 e deve terminar de forma pior. Os primeiros sintomas de que o ano começaria mal deu-se logo no inicio quando o presidente da República começou a frequentar aquelas manifestações contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Viu-se depois que na verdade o que o presidente queria era desmoralizar os dois poderes em busca de proteção para os seus três filhos, todos com problemas, maiores ou menores, com o STF. Com o Congresso, a briga era outra: o governo não conseguia fazer passar a reforma administrativa nem a reforma tributária e, portanto, era preciso desgastar o Congresso para tentar aprovar esses dois projetos que até hoje dormitam no Ministério da Economia.
Com problemas externos e internos – vários de seus ministros foram defenestrados – alguns dos mais influentes, como o da Justiça, Sérgio Moro, que entrou no governo como uma espécie de avalista dos bons propósitos do presidente Bolsonaro ou ainda o da Saúde, Henrique Mandetta, o homem que comandaria o combate à pandemia, o governo acabou patrocinando a patética reunião ministerial do dia 28 de abril, em que se tratou de tudo, menos de qualquer coisa séria.
Foi assim até que o presidente Bolsonaro encontrou de bandeja o centrão, esse grupo suprapartidário que apoia qualquer governo, desde que lhe de cargos e orçamentos para administrar. Era a fome com a vontade de comer. Afinal, o governo não tinha base parlamentar – de onde vem a sua briga com o Congresso – e o centrão gosta de cargos, a despeito de o presidente, quando ainda candidato, haver condenado de forma veemente o toma lá- dá cá.
Era, então, o candidato apolítico ou, pior, contra a política, no que foi coadjuvado por Sérgio Moro que acabou tirando o ex-presidente Lula da corrida presidencial e fazendo-o colocar em seu lugar o ex-ministro Fernando Haddad, o que acabou facilitando a vitória de Bolsonaro, que, vítima de uma facada, em Juiz de Fora, não participou de um único debate no segundo turno, principalmente, por recomendação médica.
Com o encosto do centrão, o presidente resolveu fazer o que deve aprendido ao frequentar por quase 30 anos a Câmara dos Deputados: entrar no jogo que ele tanto condenou e fazer a política do toma lá- dá cá.
E com isso, as coisas se acalmaram, até porque Bolsonaro parou também de participar das manifestações contra o Supremo e o Congresso, deixando a política percorrer o seu caminho natural, ainda que acossado pelo deputado Rodrigo Maia que lançou em seu lugar o nome do deputado paulista Baleia Rossi, presidente nacional do MDB, para bater chapa com o ungido pelo governo, o deputado alagoano Arthur Lira, num confronto em que, curiosamente, a esquerda pode ser o fiel da balança, desde que jogue unida contra o candidato do presidente Bolsonaro, que dispõe ainda de centenas de cargos para distribuir além de seis bilhões em emendas parlamentares – aquelas que só saem depois da votação, em primeiro de fevereiro.
Enfim, foi mais ou menos assim, sem entrar em muitos detalhes, o ano que vai se arrastando para o final, mas sem pressa, como se não quisesse acabar, mas dando ainda ao presidente o gosto de terminar essa parte do seu segundo mandato com a aprovação de 37 por cento, graças sem dúvida ao auxilio emergencial de 600 reais mensais que tirou muita gente da fome absoluta, mas que poderá chegar ao final se o governo, já de olho na sucessão presidencial de 2022, não driblar o orçamento e engordar o bolsa-família para manter, ainda que pela metade, essa ajuda financeira com que poderá ainda aspirar uma nova candidatura à presidência da República.
Arte: Redação