Home Saúde Morreu muito mais gente de COVID no Brasil do que apontam números oficiais

Morreu muito mais gente de COVID no Brasil do que apontam números oficiais Pesquisadores afirmam que a maioria dos casos não notificados foi entre 0 a 9 anos, chegando a uma correção de 152,8%

15 de outubro de 2021, 15h41 | Por Redação ★ Blog do Lindenberg

by Redação ★ Blog do Lindenberg

Por CNN

Levantamento da organização global de saúde Vital Strategies aponta que há subnotificação em 24,6% das mortes no Brasil por Covid-19, entre 19 de abril de 2020 e 27 de setembro de 2021. De acordo com os pesquisadores, contabilizando esses óbitos, o país estaria na marca de 712.858 vítimas pela doença.

O estudo mostra ainda que embora a subnotificação aconteça em todas as idades, ela é proporcionalmente maior na faixa de 0 a 9 anos, chegando a uma correção de 152,8%. A pesquisa utilizou dados do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe), do Ministério da Saúde, que é o principal banco de dados nacional para registro de internações e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).

A CNN entrou em contato com o Ministério da Saúde, apresentou os dados levantados pela pesquisa e questionou à pasta se pode haver erro nos dados do Governo Federal.

Em nota, o ministério informou que, por ser preliminar, a base de dados da pasta “ainda está em processo de qualificação dos dados por estados e municípios”, que “60% das causas mal definidas ocorreram fora dos estabelecimentos de saúde, condição limitante para o registro das causas que levaram à morte na Declaração de Óbito”, e que “os dados referentes aos anos de 2020 e 2021 são preliminares e estão sujeitos a alterações”.

Com relação aos casos de subnotificação em crianças, a pasta afirmou ainda que “nos casos de menos de 9 anos de idade não há evidências de aumento no número de óbitos por causas mal definidas nos anos atingidos pela pandemia de Covid-19”.

Após o resultado do estudo, a infectologista e assessora técnica sênior da Vital Strategies, Fátima Marinho, disse ter sugerido ao Ministério da Saúde a criação de um conselho para revisar os atestados de óbitos com causas definidas como “código garbage”, que são: septicemia, neoplasia, hipertensão, embolia pulmonar e insuficiência cardíaca. Segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), na quinta-feira (7), o Brasil passou a marca de 600 mil mortes causadas pelo coronavírus.

O grupo de pesquisadores da Vital Strategies concluiu que apesar de a subnotificação de óbitos no país ter sido verificada em todas as idades, ela é bem maior entre 0 a 9 anos, chegando a 152,8% mais casos.

De acordo com os dados do estudo, até 27 de setembro de 2021, o Brasil contabilizou 3.436 mortes por Covid-19 entre bebês e crianças (0 a 9 anos), sendo 2.924 entre menores de 5 anos. As estimativas oficiais do Ministério da Saúde, sem os dados corrigidos pela Vital Strategies, registram 1.359 mortes entre os menores até 10 anos e 1.113 entre crianças com até 5 anos.

O pesquisador em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenador do InfoGripe, Marcelo Gomes, concorda que em crianças a subnotificação é maior como proposto pelo estudo apresentado pela Vital Strategies, mas aponta algumas ressalvas quanto a magnitude dos casos.

“Sem dúvida nenhuma a subnotificação afeta mais as crianças por conta da dificuldade de realizar coleta adequada, mas é necessário cautela na distribuição dos inconclusivos ou sem informação por conta dos demais vírus respiratórios que voltaram a circular em 2021″, afirmou.

Segundo o especialista, a Covid-19 se mantém como a principal causa de óbitos no país em relação aos vírus respiratórios. Entre as crianças, houve um aumento expressivo de casos de vírus sincicial respiratório (VSR) em 2021, principalmente nos estados do Centro-Sul.

“Como muitos estados não conseguiram manter essa testagem desde o começo do ano, na metade Centro-Norte é difícil estabelecer o quanto do aumento de casos é Covid não diagnosticada em laboratório e o quanto foi VSR não diagnosticada”, explicou Gomes.

De acordo com Fátima Marinho, antes da pandemia, todo caso de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) deveria ser reportado ao SIVEP (Sistema de Vigilância Epidemiológica da Gripe) e eram usadas quatro categorias de classificação final dos óbitos: influenza, outro vírus respiratório, outra causa, causa não especificada ou ignorada. A partir de fevereiro de 2020, o banco de dados foi modificado para incluir a Covid-19 como uma nova categoria de classificação final para óbitos cujo causa foi a doença e teve a SRAG como complicação.

Com base nesses itens, os pesquisadores trabalharam a partir dos resultados “inconclusivos” ou “sem informação” e afirmam que houve um número de óbitos com classificação “não mencionada” e “inconclusiva” muito acima do esperado em comparação com a média histórica, quando o mundo ainda não havia sido acometido pela pandemia do coronavírus.

Desta forma, os pesquisadores redistribuíram os casos e óbitos de SRAG categorizados como “causa não especificada” ou com classificação final “ausente” para Covid-19, após subtrair os números médios observados para essas categorias em anos anteriores à pandemia (2017 e 2019).

“A racionalidade aplicada foi que praticamente não houve circulação dos vírus de influenza e vírus sincicial em 2020 e 2021 no Brasil. Assim, o aumento de 10 vezes no número de mortes por SRAG não especificado ou foi causado por um outro vírus desconhecido ou pela Covid-19”, explica a infectologista.

Sobre às causas mal definidas nos óbitos, ou seja, com classificação “não mencionada” e/ou “inconclusiva”, o Ministério da Saúde destacou que “nos anos da epidemia de Covid-19 no país, 2020 e 2021, as secretarias municipais e estaduais de saúde passaram a trabalhar na investigação de campo dos óbitos com causas mal classificadas numa situação bastante atípica. As medidas de enfrentamento da doença impuseram restrições ao trabalho das equipes na investigação de campo”.

Já em relação à falta de especificação nos óbitos, a pasta informou que “os casos e óbitos, assim classificado por falta de especificação, podem decorrer de problemas com as amostras, como baixa qualidade, manuseio inadequado, armazenamento inapropriado, transporte inadequado e processamento tardiamente atualizado, prejudicando o diagnóstico”.

Para Fátima Marinho, é necessário que os dados de óbitos no país sejam revisados. Segundo ela, muitas vezes o erro acontece porque os médicos confundem a causa da morte com o agravamento do quadro.

“Há médicos que não certificam corretamente a causa da morte, confundindo o modo de morrer com a causa da morte. Por exemplo, a SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave] não é causa de morte, é o modo de morrer. SRAG é uma complicação de uma doença respiratória grave, causada por vírus da influenza ou pelo novo coronavírus. Covid é a causa da morte”, explica.

“Outras vezes, o médico não tem informação suficiente para certificar corretamente a causa da morte e isso acontece quando a morte ocorre muito rápida, não sendo possível colher exames complementares e histórico clínico. Mas vale lembrar também que o atestado de óbito é algo muito sério e que não relatar a causa da morte real pode se configurar como falsidade ideológica, se isso for intencional”, concluiu a infectologista.

A Vital Strategies atua em 70 países e vem monitorando a cada 15 dias as notificações de mortes causadas por Covid-19 divulgadas em sistemas oficiais de notificação. A organização está revisando os dados divulgados pelo Ministério da Saúde.

Foto: Bruno Kelly/Reuters

LEIA TAMBÉM

Envie seu comentário