Por G1
Em pareceres enviados ao Congresso, a Polícia Federal alertou que um projeto de lei que flexibiliza a compra e o uso de armas de fogo pode agravar a violência no país.
O projeto altera o Estatuto do Desarmamento, já foi aprovado na Câmara, mas ainda não no Senado. Com relação a um dos trechos da proposta, a PF escreveu que o dispositivo poderia trazer de volta “uma situação caótica” no país, com potencial de “tornar muito piores os índices de criminalidade”.
Os pareceres foram divulgados em reportagem do jornal “Folha de S. Paulo” nesta sexta-feira (29). A TV Globo também teve acesso aos documentos.
A flexibilização do porte e posse de armas de fogo é uma das principais bandeiras do presidente Jair Bolsonaro. Ao longo do mandato, ele tem assinado decretos e patrocinado projetos no Congresso para facilitar o acesso aos itens.
A PF elaborou as análises sobre o projeto que altera o Estatuto do Desarmamento a pedido do Congresso.
Em uma das análises, enviadas em 2019, a PF escreveu que o projeto, da forma como foi apresentado, seria “um retrocesso na política pública de controle de armas de fogo”.
De acordo com a PF, dispositivos do texto estimulariam o “cidadão comum” a se cadastrar como CAC (caçador, atirador esportivo ou colecionador) para “driblar a legislação” e obter armas mais facilmente.
“Consideramos essas mudanças um retrocesso na política pública de controle de armas de fogo prevista na legislação atual, e que resultará, sem dúvidas, no retorno da situação caótica no país de excessiva oferta de armas de fogo, inclusive ilegais, em circulação, podendo tornar muito piores os índices de criminalidade”, afirmou a PF.
Ainda segundo a PF, trechos do projeto de lei foram escrito “sem prever as consequências dessas descriminalizações [do porte e posse de armas] para a delinquência geral e o crime organizado”.
Ao comentar a sugestão de mudança na lei que pretende dispensar caçadores e atiradores desportivos de autorização do Exército para a aquisição de acessórios de armas de fogo, a PF externou “imensa preocupação” e ressaltou que a alteração “não faz qualquer sentido”.
“Policiais e militares, agentes do Estado que tem a prerrogativa de porte como instrumento de trabalho, possuem regras muito mais rígidas para lidar com esse tipo de material, o que dirá os civis com acesso facilitado a armas de fogo e demais materiais relacionados, que não precisarão prestar contas de suas aquisições, importações, usos e comercializações”, escreveu a PF.
Aprovação, apesar das críticas
Apesar das críticas, a PF disse que aprova, com ressalvas, que sejam feitas mudanças no Estatuto do Desarmamento, desde que respeitando a concepção original da lei, que é diminuir a violência no país. A PF acrescentou ainda que mudanças devem ser feitas apenas excepcionalmente.
“As correções e aperfeiçoamentos que devem ser feitos são necessários especialmente quando venham a auxiliar os órgãos de segurança na redução de índices de violência”, escreveu.
Projeto no Congresso
O projeto de lei foi apresentado pelo governo federal em junho de 2019 e foi aprovado com alterações pela Câmara dos Deputados naquele ano. Dentre os pontos mais polêmicos há o fim de um um limite para a aquisição de armas de fogo. Atualmente, atiradores desportivos podem ter até 60 armas (30 de calibre permitido e 30 de calibre restrito). A proposta autoriza a compra ilimitada de armamento.
O projeto também autoriza policiais a comprarem armas ilimitadamente, caso comprovem necessidade. A legislação em vigor estabelece que os agentes de segurança podem ter até oito armas.
A proposta do governo inclui o fim do limite máximo na compra de munição. O decreto que regula a matéria e que está em vigor coloca um limite de até 6 mil unidades de munição por ano para armas de uso permitido. O projeto de lei também elimina a exigência de marcação de munições e de código de rastreio em cada bala
O governo federal propõe que Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs) possam transportar uma arma curta municiada e pronta para uso, em qualquer horário do dia, no trajeto entre o local de guarda do equipamento e os locais de treinamento, de prova, de competição ou de caça.
Flexibilização no porte e posse de armas no Brasil
De acordo com um levantamento do Instituto Sou da Paz, desde que Jair Bolsonaro assumiu a presidência, o governo federal já publicou 17 decretos presidenciais, 19 portarias, 3 instruções normativas, 2 projetos de lei e duas resoluções com o objetivo de ampliar o acesso da população a armas e munição.
Segundo o Anuário de Segurança Pública, o número de pessoas com certificados de registro de armas de fogo cresceu 474% durante o governo Jair Bolsonaro.
Em 2018, antes de Bolsonaro assumir, o número de pessoas com registros CAC era de 117,5 mil. Ou seja, 56 brasileiros a cada 100 mil possuíam licença para armas. Agora há 673,8 mil registros. Isso quer dizer que, a cada cem mil pessoas, 314 têm a autorização.
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