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Novo acordo para reparação de danos em Fundão é criticado Segundo entidades e atingidos pelo rompimento da barragem, mineradoras são protegidas e vítimas permanecem sem amparo.

22 de agosto de 2022, 18h06 | Por Redação ★ Blog do Lindenberg

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Por ALMG

Representantes de entidades civis, organizações e do Tribunal de Contas do Estado (TCE) pediram mais transparência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Governo de Minas com relação a possível assinatura de novo acordo de reparação dos danos provocados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (Região Central).

Debate público sobre o assunto, realizado pela Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta segunda-feira (22/8/22), contou com a presença de vários especialistas e de representantes das comunidades impactadas pela tragédia, que completa sete anos em novembro.

Segundo o jornal Valor Econômico, uma reunião realizada em Brasília no último dia 10 de agosto teria como objetivo chegar a um novo acordo, mediado pelo CNJ, com a Samarco, mineradora responsável pela tragédia de Mariana, e suas controladoras, a Vale e a BHP Billiton. De acordo com o jornal, o que impediria a formalização de um acordo é a responsabilização das mineradoras por danos futuros, além do valor das indenizações.

Participam das negociações, além do CNJ e das mineradoras, a Procuradoria-Geral da União, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, a Defensoria Pública e o Ministério Público dos dois estados.

De acordo com o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), que presidiu comissão externa na Câmara dos Deputados criada para acompanhar de perto os desdobramentos da tragédia, a Fundação Renova, responsável pela maior parte dos recursos e das negociações, vem sendo duramente criticada pelos atingidos, tendo em vista ser basicamente uma executora das vontades da Vale nesses territórios.

“Não dá pra acreditar na mineradora, porque ela não corrigiu os problemas ambientais. Sabemos que mesmo na foz do rio, ainda hoje, tem muita lama. Quando você cobra isso, eles se recusam a fazer testes na água. Eles escondem a situação real, além de fazerem acordos insuficientes e não terem pago nada a muitos dos atingidos até hoje”, afirmou.

Além disso, o parlamentar se posicionou contra qualquer acordo ser assinado antes de haver uma prestação de contas do que foi feito nesses sete anos. “Nos foi garantido que nada será assinado antes dos atingidos serem ouvidos e de sabermos se os pressupostos básicos que cobramos foram cumpridos. Muitos, a gente sabe que não foram. Espero que o CNJ cumpra com essa promessa”, pontuou.

Para Rogério Correia, o valor cogitado do suposto acordo seria “absolutamente ridículo” e o momento anunciado para que ele aconteça, eleitoreiro. “Por que nenhum dos criminosos foi preso até hoje?”, questionou.

Atingidos sem amparo

Defensora pública integrante do Núcleo Estratégico de Proteção aos Vulneráveis em Situação de Crise da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, Carolina Ferreira defendeu assessoria técnica independente aos atingidos, algo prometido desde o começo e jamais cumprido. Integrante da Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Thiago Alves reforçou o pedido.

“As empresas estão organizadas para enfrentar os atingidos desde o início. A Renova protege o CNPJ das empresas, é usada como instrumento sistemático de desmobilização, invisibilizando as demandas. Tudo quem controla são eles – o recurso, as narrativas. A partir de 2020, a Justiça entrou para esse time, atuando alinhada com as empresas”, disse Thiago Alves.

Ainda segundo ele, em acordos individuais, os atingidos foram obrigados a contratar advogados, sendo levados a acreditar que isso aceleraria o processo. “Assinaram procurações e os advogados sumiram”, relatou.

Danos ambientais, sociais e econômicos

Superintendente de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado, Pedro Henrique Azevedo afirmou que, caso o acordo se efetive, será analisado pelo tribunal sob três pilares: ambiental, social e econômico.

“Precisamos analisar se esses recursos serão usados para atenuar os danos. Mas como quantificar a perda de biodiversidade? Dano ambiental não é monetizado”, refletiu.

Já no pilar social, ele disse que a fiscalização vai verificar se os povos estão recebendo os recursos que lhes foram tirados e se as necessidades das famílias estão sendo satisfeitas.

Por fim, segundo Pedro Azevedo, no pilar econômico será preciso investigar se os municípios estão aplicando recursos para diversificar sua base econômica das cidades, para que não dependam mais da mineração.

Representante dos Indígenas do Movimento de Ressurgência Puri de Resplendor e Aimorés (Vale do Rio Doce), Meire Minimá Purí relatou que tanto a Renova quanto a Vale invisibilizam completamente a luta dos indígenas no local.

O Censo de 2010 do IBGE já registrou 670 indígenas autodeclarados Purí. Apesar de muitos já viverem em áreas urbanas, ainda mantêm locais de encontro no território invadido pela lama da barragem.

Os prejuízos, de acordo com a convidada, relacionam-se, em especial, à qualidade da água do Rio Doce, que tem prejudicado a saúde e as atividades da comunidade, como pesca e cultivo de ervas medicinais. “Nossos trajes tradicionais são chamados de ‘fantasias’. Nos desrespeitam cotidianamente”, lamentou.

A deputada Beatriz Cerqueira (PT) reforçou que o território atingido continua a ser controlado pelas mineradoras. “Pessoas foram assassinadas, mas os réus controlam a cena do crime. É uma situação escandalosa. A Renova renova o crime dia a dia. Milhares de pessoas estão sem ter os seus direitos reconhecidos. E nenhuma reparação vai devolver o que foi retirado dessas pessoas”, disse.

Programação

O debate público prossegue na parte da tarde. Às 14h30, serão discutidos os desafios institucionais, a participação social e o direito à informação no contexto da repactuação da reparação de danos. Às 16 horas, serão apresentadas propostas para as negociações, à luz da Política Estadual dos Atingidos por Barragens.

Foto: Guilherme Bergamini

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