Por Terra
“É um voto de protesto!”, diz um morador de Córrego Fundo, cidade do interior de Minas Gerais, ao justificar por que escolheu votar nulo para presidente em 2018 e fará o mesmo nestas eleições. O homem, que prefere não se identificar, vive no município com maior percentual de votos nulos na última eleição presidencial – 19,6% dos eleitores.
“Achei que nenhum deles iria valer a pena, e esse ano continuo achando. Eles só prometem e, na hora de fazer, não fazem. Meu filho é bolsonarista doente, mas eu prefiro votar nulo. Tem muito ladrão e corrupção. Hoje, com o salário e o preço das coisas, você mal vive direito”, opina a gari Cleunice da Silva, de 51 anos, que foi uma das pessoas que votou nulo há quatro anos.
A desesperança é um sentimento comum a quem opta por anular seu direito à escolha de um representante político. Nas eleições de 2018, o percentual foi o maior desde 1989, com 7,4% do eleitorado – o equivalente a 8,6 milhões de pessoas, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.
A dona de casa Élida Sônia Guimarães, de 56 anos, se diz cansada e desacreditada das promessas que são feitas.
“A gente vai lá e vota porque é obrigado. E é desesperança mesmo, porque meu pai sempre me incentivou a votar em vida e dizia: ‘Eu perco meu voto, mas não voto nulo ou branco’. Ele votou até o último ano de vida dele”, lembra a moradora.
“Nunca nenhum candidato veio aqui”
Apesar do sentimento em relação aos candidatos, Córrego Fundo é uma cidade típica do interior. Além de prefeitura, igreja e comércio ao redor de uma praça central, não há nenhum adesivo, toalha, bandeira, outdoor ou camiseta em apoio a qualquer candidato à Presidência da República.
O acesso à cidade também não é tão simples. Embora esteja a cerca de 250 km de distância de Belo Horizonte, capital de Minas, não há linha de ônibus direto. Para chegar até lá, percorremos quase cinco horas de viagem de ônibus até Formiga, município vizinho, a partir de onde ainda fizemos mais 30 minutos do trajeto de táxi.
A ausência do município mineiro na rota dos presidenciáveis é também determinante no desestímulo ao voto. Um morador de Córrego Fundo lamenta que, em suas palavras, “ninguém se importa” com as necessidades do povo.
“Eu sempre assisto sabatina, debates, e é só um atacando o outro. E nunca nenhum presidente ou candidato à Presidência veio aqui. Então, da mesma forma que eles têm o desinteresse com nossa cidade, também não tenho interesse em votar neles. Se Simone Tebet tivesse chance de ganhar, é a única que eu votaria”, declara o homem, que prefere não ser identificado.
Seu objetivo com o voto nulo é chamar a atenção dos políticos e fazê-los perceber o quanto a população está insatisfeita. Com isso, acredita, eleições futuras podem ser influenciadas.
“Voto nulo não é melhor forma de protesto”, diz especialista
A professora Anna Paula Mendes, que leciona Direito Eleitoral na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e é membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), explica que votar nulo, assim como votar em branco, não é uma forma eficaz de protestar contra os candidatos. Isso porque, embora invalidem o voto de formas diferentes, ambos são descartados na apuração do resultado das eleições.
“Há uma fake news muito difundida em período eleitoral de que se houver mais de 50% dos votos nulos haverá uma nova eleição. É uma informação falsa, que ocorre de uma má interpretação do código eleitoral”, explica. “Se falava, muito antigamente, que o voto em branco poderia ir para outro candidato, mas isso não decorria do sistema eleitoral e sim da fraude que as vezes acontecia na época em que o voto era feito em papel”.
O voto em branco ocorre quando a pessoa aperta a tecla com escrita “branco” na urna eletrônica. Já para votar nulo é preciso apertar uma sequência numérica que não pertence a nenhum candidato ou partido.
“Muitas pessoas, por causa de uma crise de representatividade política, optam por anular o voto, mas não faz diferença na escolha, ao contrário, porque só delega o direito de escolha de candidato aos que irão exercer a cidadania de escolher um candidato. A melhor forma de protesto não é anular o voto, e, sim, pesquisar as opções possíveis e escolher a mais consciente”, destaca.
Quem não vota nulo está dividido
Apesar do pouco interesse da população nas eleições presidenciais, os moradores determinados a exercer sua cidadania se dividem entre os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder nas pesquisas de intenção de voto, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição. A tendência em prol do petista é significativa, devido ao mesmo motivo: melhorias socioeconômicas.
A gari Ana Maria Vieira, uma das apoiadoras de Lula, diz que a vida era melhor durante mandato do petista.
“Pode ser até que ele roubou, mas ele não prejudicou os pobres, como o Bolsonaro tá prejudicando, porque tira de nós pra dar para os ricos. Na época do Lula, todo mundo tinha carrinho, comia carne. Agora, a gente passa reto do açougue. O Bolsonaro ofendeu muito os pobres na candidatura dele, fora que morreu muita gente na pandemia”, destaca.
O forneiro José Anibo Leal interrompeu uma partida de dominó para também demonstrar apoio ao candidato do PT. Orgulhoso por se autodeclarar “lulista”, ele critica os votos nulos dos conterrâneos, porque deixam de cumprir o “dever de cidadão”.
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Esquecidos e sem esperanças: cidade mineira protesta com votos nulos nas eleições
Moradores de Córrego Fundo, campeã de votos nulos para candidatos à presidência em 2018, não se sentem representados por candidatos
Isabella Lima, de Córrego Fundo (MG)Isabella Lima
30 set2022- 05h00
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Córrego Fundo (MG): cidade mineira protesta com votos nulos nas eleições:
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“É um voto de protesto!”, diz um morador de Córrego Fundo, cidade do interior de Minas Gerais, ao justificar por que escolheu votar nulo para presidente em 2018 e fará o mesmo nestas eleições. O homem, que prefere não se identificar, vive no município com maior percentual de votos nulos na última eleição presidencial – 19,6% dos eleitores.
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“Achei que nenhum deles iria valer a pena, e esse ano continuo achando. Eles só prometem e, na hora de fazer, não fazem. Meu filho é bolsonarista doente, mas eu prefiro votar nulo. Tem muito ladrão e corrupção. Hoje, com o salário e o preço das coisas, você mal vive direito”, opina a gari Cleunice da Silva, de 51 anos, que foi uma das pessoas que votou nulo há quatro anos.
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A desesperança é um sentimento comum a quem opta por anular seu direito à escolha de um representante político. Nas eleições de 2018, o percentual foi o maior desde 1989, com 7,4% do eleitorado – o equivalente a 8,6 milhões de pessoas, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.
A dona de casa Élida Sônia Guimarães, de 56 anos, se diz cansada e desacreditada das promessas que são feitas.
“A gente vai lá e vota porque é obrigado. E é desesperança mesmo, porque meu pai sempre me incentivou a votar em vida e dizia: ‘Eu perco meu voto, mas não voto nulo ou branco’. Ele votou até o último ano de vida dele”, lembra a moradora.
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“Nunca nenhum candidato veio aqui”
Apesar do sentimento em relação aos candidatos, Córrego Fundo é uma cidade típica do interior. Além de prefeitura, igreja e comércio ao redor de uma praça central, não há nenhum adesivo, toalha, bandeira, outdoor ou camiseta em apoio a qualquer candidato à Presidência da República.
O acesso à cidade também não é tão simples. Embora esteja a cerca de 250 km de distância de Belo Horizonte, capital de Minas, não há linha de ônibus direto. Para chegar até lá, percorremos quase cinco horas de viagem de ônibus até Formiga, município vizinho, a partir de onde ainda fizemos mais 30 minutos do trajeto de táxi.
A ausência do município mineiro na rota dos presidenciáveis é também determinante no desestímulo ao voto. Um morador de Córrego Fundo lamenta que, em suas palavras, “ninguém se importa” com as necessidades do povo.
O comerciante Gustavo Faria afirma que não gostaria que nem Lula, nem Bolsonaro vencessem as eleições e por isso em 2018 votou no partido Novo
Foto: Isabella Lima
Córrego Fundo é uma cidade típica do interior, não há nenhum adesivo, toalha, bandeira, outdoor ou camiseta em apoio a qualquer candidato à Presidência da República
Foto: Isabella Lima
Morador de Córrego Fundo afirma que voto nulo em 2018 e nestas eleições é um protesto contra a situação política do País
Foto: Isabella Lima
A gari Ana Maria Vieira revela que seu voto será em Lula pois acredita que a vida era melhor durante o mandato do petista
Foto: Isabella Lima
Forneiro José Anibo Leal demonstrou apoio ao candidato do PT e se diz orgulhoso por se autodeclarar “lulista”
Foto: Isabella Lima
Igreja de Córrego Fundo, localizada na região central da cidade
Foto: Isabella Lima
Rua em que fica comércio da dona de casa Élida Sônia Guimarães, que votou nulo porque está cansada e desacreditada das promessas que são feitas
Foto: Isabella Lima
Gari Cleunice da Silva revela que foi uma das pessoas que votou nulo há quatro anos e que esse ano mantém o mesmo posicionamento, pois acredita que os políticos não cumprem suas promessas
Foto: Isabella Lima
Forneiro Camilo Lelis de Faria defende o presidente Jair Bolsonaro como a melhor opção para o cargo de presidente
Foto: Isabella Lima
“Eu sempre assisto sabatina, debates, e é só um atacando o outro. E nunca nenhum presidente ou candidato à Presidência veio aqui. Então, da mesma forma que eles têm o desinteresse com nossa cidade, também não tenho interesse em votar neles. Se Simone Tebet tivesse chance de ganhar, é a única que eu votaria”, declara o homem, que prefere não ser identificado.
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Seu objetivo com o voto nulo é chamar a atenção dos políticos e fazê-los perceber o quanto a população está insatisfeita. Com isso, acredita, eleições futuras podem ser influenciadas.
“Voto nulo não é melhor forma de protesto”, diz especialista
A professora Anna Paula Mendes, que leciona Direito Eleitoral na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e é membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), explica que votar nulo, assim como votar em branco, não é uma forma eficaz de protestar contra os candidatos. Isso porque, embora invalidem o voto de formas diferentes, ambos são descartados na apuração do resultado das eleições.
“Há uma fake news muito difundida em período eleitoral de que se houver mais de 50% dos votos nulos haverá uma nova eleição. É uma informação falsa, que ocorre de uma má interpretação do código eleitoral”, explica. “Se falava, muito antigamente, que o voto em branco poderia ir para outro candidato, mas isso não decorria do sistema eleitoral e sim da fraude que as vezes acontecia na época em que o voto era feito em papel”.
Igreja de Córrego Fundo, localizada na região central da cidade
Foto: Isabella Lima / Redação Terra
O voto em branco ocorre quando a pessoa aperta a tecla com escrita “branco” na urna eletrônica. Já para votar nulo é preciso apertar uma sequência numérica que não pertence a nenhum candidato ou partido.
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“Muitas pessoas, por causa de uma crise de representatividade política, optam por anular o voto, mas não faz diferença na escolha, ao contrário, porque só delega o direito de escolha de candidato aos que irão exercer a cidadania de escolher um candidato. A melhor forma de protesto não é anular o voto, e, sim, pesquisar as opções possíveis e escolher a mais consciente”, destaca.
Quem não vota nulo está dividido
Apesar do pouco interesse da população nas eleições presidenciais, os moradores determinados a exercer sua cidadania se dividem entre os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder nas pesquisas de intenção de voto, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição. A tendência em prol do petista é significativa, devido ao mesmo motivo: melhorias socioeconômicas.
A gari Ana Maria Vieira, uma das apoiadoras de Lula, diz que a vida era melhor durante mandato do petista.
“Pode ser até que ele roubou, mas ele não prejudicou os pobres, como o Bolsonaro tá prejudicando, porque tira de nós pra dar para os ricos. Na época do Lula, todo mundo tinha carrinho, comia carne. Agora, a gente passa reto do açougue. O Bolsonaro ofendeu muito os pobres na candidatura dele, fora que morreu muita gente na pandemia”, destaca.
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O forneiro José Anibo Leal interrompeu uma partida de dominó para também demonstrar apoio ao candidato do PT. Orgulhoso por se autodeclarar “lulista”, ele critica os votos nulos dos conterrâneos, porque deixam de cumprir o “dever de cidadão”.
Gari Cleunice da Silva revela que foi uma das pessoas que votou nulo há quatro anos e que esse ano mantém o mesmo posicionamento, pois acredita que os políticos não cumprem suas promessas
Foto: Isabella Lima / Redação Terra
“Eu formei uma filha para advogada no tempo do Lula e fiz quatro casas, sendo que nem leitura eu tenho, tudo no serviço braçal. Agora, no tempo do Bolsonaro, mal consigo fazer uma compra. Eu sempre serei Lula e não mudo nem que venha mais um milhão de candidatos”, diz ele, que votou em Fernando Haddad em 2018.
Apesar de dividir a mesma profissão de José, o forneiro Camilo Lelis de Faria defende o presidente Jair Bolsonaro como a melhor opção para o cargo. A opinião é compartilhada pelo segurança João Nilton.
“Bolsonaro é a melhor opção. Ele foi um bom presidente, melhor que os outros que vieram. Continuo votando nele esse ano”, avalia.
Em meio a essa polarização, Gustavo Henrique de Faria afirma que não gostaria que nem Lula, nem Bolsonaro vencessem as eleições. Foi por isso que em 2018 votou no partido Novo. Neste ano, no entanto, ele decidiu viajar e irá justificar o voto.
“Acho que não tem que ser nem Lula, nem Bolsonaro. Tinha que ganhar uma terceira via”, opina.
Foto: Isabella Lima / Redação Terra