Por Metrópoles
Duas figuras-chave citadas em investigações que apuram ações e omissões relacionadas à tentativa de golpe se encontraram 48 horas antes dos ataques em Brasília. Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, e atualmente preso, reuniu-se em 6 de janeiro com Gustavo Henrique Dutra de Menezes (foto em destaque), general do Exército que chefiava o Comando Militar do Planalto (CMP) durante o atentado contra a democracia em 8/1.
O registro da reunião foi obtido pelo Metrópoles e mostra o encontro às 10h do dia 6 de janeiro, uma sexta-feira, na sala de reuniões da Secretaria de Segurança Pública.
Veja a agenda de Torres naquele dia:
Na noite daquele mesmo dia, Torres viajou para os Estados Unidos, e, dois dias depois, no domingo, apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) tentaram decretar um golpe de Estado com o uso da violência, invadindo e destruindo prédios públicos. A maioria dos criminosos estava acampado em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília.
O encontro não contou com confecção de ata. A reportagem questionou a pasta sobre os temas tratados, mas não obteve retorno até a última atualização desta matéria.
Torres assumiu a SSP em 2 de janeiro de 2023, após deixar o cargo de ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Ele teve seis reuniões antes de viajar ao exterior, deixar a função e perder o posto devido às investigações sobre a tentativa de golpe. Além do encontro com Dutra, o ex-secretário esteve com o então comandante-geral da Polícia Militar do DF, coronel Fábio Augusto Vieira, em 3 de janeiro.
Fábio chegou a ser preso por ordem de Alexandre de Moraes em 10 de janeiro, por suposta omissão ou conivência nos atos terroristas do dia 8 do mesmo mês. Porém, em 3 de fevereiro, o ministro concedeu liberdade provisória ao coronel, avaliando que ele não teve responsabilidade direta nas falhas para conter as invasões. Já Torres continua detido e sendo investigado em inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF).
Acusações de apoio aos golpistas
Denúncias colhidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Legislativa do DF e relatos feitos na Corregedoria da Polícia Militar do Distrito Federal apontam que o general Dutra foi responsável por impedir ações contra os bolsonaristas no QG. Uma semana após os atos terroristas de 8/1, o Exército demitiu Dutra do cargo, que passou a ser ocupado pelo general Ricardo Piai Carmona.
Acusações de que o Comando Militar do Planalto protegia os bolsonaristas foram citadas em mais de uma sessão da CPI que investiga os atos antidemocráticos. O ex-secretário de Segurança Pública do DF Júlio de Souza Danilo, por exemplo, relatou ocasiões em que o CMP, sob comando de Dutra, teria impedido a desmobilização do acampamento golpista, como em 29 de dezembro de 2022.
“Ele dizia que tinha recebido ordens para não realizar a desobstrução, que fariam [o Exército] por conta deles”, afirmou Júlio. O ex-chefe do Comando Militar do Planalto ainda foi citado nominalmente na CPI pelo coronel da PMDF Jorge Eduardo Naime. Segundo o policial, Dutra teria impedido prisões de golpistas, mesmo após ordem do ministro do STF Alexandre de Moraes.
“Olhei para trás e vi uma tropa de choque montada [na área do QG], com blindados, mas voltados para a PM, protegendo o acampamento. Nisso, chega o general Dutra e começa a discussão com [Ricardo] Cappelli. O interventor dizia que tinha ordem para entrar, mas Dutra ficava dizendo que não iria. O Cappelli insistindo que ia prender quem estava lá e ele negando. Em determinado momento, Dutra pegou um telefone e ligou, disseram que ligou para o presidente Lula”, contou Naime.
O Metrópoles também mostrou, em fevereiro, que policiais que tentaram desmontar o acampamento naquele dia fizeram relatos duros à Corregedoria da PMDF sobre a conduta de Dutra. Segundo os PMs, o general não só proibiu o desmonte como fez uma ameaça. Ele disse que, caso a Polícia Militar levasse em frente o desmonte naquela noite, haveria um “banho de sangue”.
Os próprios golpistas chegaram a afirmar que o Exército vinha colaborando com o acampamento. Três dias antes da invasão na Praça dos Três Poderes, um vídeo mostrando militares descarregando itens no QG e atuando na estrutura do movimento circulou pela internet. Bolsonaristas comemoraram: “O Exército está ajudando”, disse uma mulher. Na ocasião, as Forças Armadas negaram, argumentando que estavam dando suporte à desmontagem e retirada de estruturas.
Convites para CPI
Tanto o general Dutra quanto Anderson Torres foram convidados pelos deputados distritais a prestar esclarecimentos sobre o dia 8 de janeiro na CPI. Torres, por estar preso, não pode ser levado de forma coercitiva para a sessão, e escolheu não ir. Ele negou mais de um requerimento de oitiva.
Já o general foi convocado em um requerimento mais recente, aprovado na última quinta-feira (23/3). O documento também pede o depoimento de Marco Edson Gonçalves Dias, ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República.
Ambos podem recusar o convite. A CPI, que ocorre em âmbito distrital, ainda estuda se é possível juridicamente convocar militares do Exército, que é uma Força do governo federal. Nesse caso, só poderia haver recusa embasada em decisão judicial.
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