Por Hoje em dia / Blog do Lindenberg
Talvez tenha sido o mais longo depoimento já prestado por um ex-presidente da República, no caso, Jair Bolsonaro, na última quarta-feira. Foram três horas de depoimento, feito talvez só igualado na época do regime militar, quando Brizola, Jango ou Carlos Lacerda, tenham sido levados a depor nos longos e intermináveis depoimentos. Ainda assim, Bolsonaro foi ouvido na Polícia Federal na condição de investigado – e não como testemunha, por exemplo – o que torna sua situação mais complicada, podendo até mesmo tornar-se inelegível no próximo pleito, a despeito do descrédito de seus seguidores quanto a essa hipótese.
O incrível é que o ex-presidente disse à Polícia Federal que só soube da entrada das joias no país, um tipo de contrabando por bem dizer, no ano passado, assim mesmo por acaso – mas também não disse quem o alertou para a gravidade do caso, como se tudo fosse normal, joias essas avaliadas em mais de 16 milhões de reais e em três lotes – o último deles estregue ao Tribunal de Contas na semana passada.
Curiosa foi a maneira com que a Polícia Federal tratou esse caso, grave, até porque Bolsonaro colocou tudo em seu nome, como se não tratasse de um caso de Estado. A Polícia Federal montou dez depoimentos ao mesmo tempo em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro com o objetivo de confrontar informações e impedir compartilhamentos de defesa. O fato é que o ex-presidente tratou as joias que ganhou da Arábia Saudita como se fossem objetos pessoais. Um dos lotes, por exemplo, teria sido endereçado a Michele Bolsonaro, como se fosse um, presente casual, mesmo valendo mais de 16 milhões de reais, daí porque se julga que o problema para o ex-presidente é mais político do que jurídico, ainda que pese contra Bolsonaro uma série de atos considerados ilegais ou meramente protocolares, como a recusa de passar a faixa ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. No caso do ex-presidente, o que se estranha é o fato de que todo presente dado a alguém no exterior tem que ser registrado na alfândega como se custasse cerca de mil dólares e a comitiva do ex-ministro Bento Albuquerque não ter se dado conta disso, o que torna o caso mais grave até porque boa parte do governo tentou reaver as joias, inclusive o próprio ex-ministro. E tudo foi colocado como se pertencesse à ex-primeira-dama e ao ex-presidente, como se fossem presentes aparentemente casuais, quando na verdade, no entendimento do TCU, são presentes de Estado e assim deveriam ser classificados, doando-se tudo à União, inclusive a pistola e o fuzil que Bolsonaro também ganhou numa dessas viagens à Arábia Saudita. Resta agora que se faça uma vistoria completa em todos os presentes que Bolsonaro recebeu durante o seu mandato, inclusive de camisas de futebol e até bonés. Mas tudo isso fica em segundo plano diante do ataque cruel que matou quatro crianças em Blumenau – o país, em luto, chora essas mortes.