A eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, ainda que antecipada pelos mercados globais recentemente com o “Trump Trade”, deve seguir reverberando – inclusive no Brasil.
O impacto do segundo mandato do republicano pode se refletir nos mercados emergentes e em setores específicos, considerando fatores como volatilidade do câmbio, balança comercial e exposição de empresas a mercados americanos e chineses.
O retorno de Trump à Casa Branca tende a levar a uma valorização do dólar e aumento nos rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA. As promessas de Trump sobre tarifas e imigração são vistas como inflacionárias por analistas, o que é favorável para o dólar. Esses movimentos pressionariam os países latino-americanos com desvalorização cambial e a necessidade de manter ou elevar as taxas de juros para conter uma possível inflação importada, especialmente em países com elevada dívida externa e inflação controlada pelo câmbio.
No caso do Brasil, analistas do Bradesco BBI dizem que a combinação de dólar valorizado e títulos americanos em alta tornaria o real mais vulnerável, apesar da potente balança comercial. A vitória de Donald Trump pode intensificar ainda mais a pressão de alta sobre o dólar no Brasil, também segundo analistas consultados pela Reuters.
O governo Trump, historicamente avesso à dependência de produtos chineses, tende a retomar políticas protecionistas e reavaliar acordos comerciais. O aumento das tarifas sobre importações chinesas, caso sejam implementadas novas barreiras de 10%, poderia impactar significativamente as exportações de commodities da América Latina, um mercado dependente das trocas comerciais tanto com EUA quanto com a China, alertam os analistas.
Empresas brasileiras com grande exposição à China e exportadores de produtos industrializados podem sofrer com a queda na demanda chinesa, que por sua vez já enfrenta dificuldades econômicas.
O Brasil, maior exportador de produtos agrícolas para os dois mercados, precisaria reavaliar suas parcerias estratégicas em um contexto de guerra comercial EUA-China. Para exportadores de carne bovina e soja, por exemplo, isso significa um potencial ajuste nos contratos de venda e a busca por novos mercados para absorver o excedente.
Oportunidades para setores específicos
Se por um lado o retorno de Trump à presidência representa desafios para o setor externo de países latino-americanos, algumas empresas brasileiras e chilenas, especialmente aquelas com exposição ao mercado americano, poderiam se beneficiar do incentivo ao setor energético e das políticas de desregulamentação econômica defendidas pelos republicanos, apontam os estrategistas do BBI. O setor de petróleo e gás, com empresas como a brasileira Petrobras (PETR4) poderá observar um crescimento nas exportações para os EUA, caso Trump mantenha o estímulo fiscal para o setor energético.
No entanto, empresas latino-americanas com dívidas em dólar e dependência do mercado doméstico, como Lojas Renner (LREN3) e Magazine Luiza (MGLU3), podem ser prejudicadas, sobretudo diante de um cenário de juros elevados, de acordo com o relatório. A valorização do dólar pressionaria os custos operacionais de empresas no setor de varejo e construção civil, aumentando o endividamento e impactando a margem de lucro. Para o setor de aviação, Gol (GOLL4) e Azul (AZUL4) também enfrentariam dificuldades, com o encarecimento de combustíveis e custos de leasing em dólar, reduzindo o potencial de expansão.
Segundo relatório da XP Investimentos, setores de exportação de commodities, como o agronegócio, tendem a se beneficiar com a vitória de Trump. Esse segmento foi favorecido durante a guerra comercial com a China em sua presidência anterior, quando a demanda chinesa se voltou ao mercado brasileiro como alternativa aos produtos americanos. A lista da XP inclui empresas como SLC Agrícola (SLCE3) e BrasilAgro (AGRO3), que podem observar aumento na demanda por grãos brasileiros.
Além do agronegócio, outros segmentos como o de mineração e siderurgia podem se destacar. A Gerdau (GGBR4), com forte atuação nos EUA, poderia se beneficiar das tarifas impostas aos produtos chineses, aumentando os preços do aço. Já a Braskem (BRKM5) pode ver um efeito positivo com a valorização do dólar, favorecendo sua receita em moeda americana.
Contudo, os estrategistas da XP também alertam que algumas políticas econômicas de Trump podem trazer desafios para o Brasil. Uma proposta de tarifa global de 10% sobre importações pode impactar produtos brasileiros como petróleo, aço semiacabado e café. Além disso, os analistas avisam que a expansão da produção de petróleo nos EUA, impulsionada por políticas de facilitação ambiental durante o governo Trump, pode pressionar os preços globais de petróleo para baixo, influenciando diretamente empresas de óleo e gás.
Segundo a XP, entre as ações que podem capitalizar essa situação estão:
• SLC Agrícola (SLCE3) e BrasilAgro (AGRO3) – empresas do agronegócio, com potencial de aumento na demanda chinesa por grãos brasileiros, caso ocorra uma nova rodada de tarifas americanas sobre produtos chineses.
• Gerdau (GGBR4) – a siderúrgica, com operações relevantes nos EUA, poderia ver uma valorização no preço do aço devido a tarifas sobre produtos chineses, elevando a demanda local.
• Braskem (BRKM5) – no setor petroquímico, a empresa pode ser beneficiada por um dólar mais forte, uma vez que suas receitas são em dólares e parte dos custos em reais.
Para o Morgan Stanley, a reeleição de Trump pode trazer incertezas adicionais para o Brasil. Os analistas concordam que Trump tem uma abordagem mais protecionista em relação ao comércio, o que pode resultar em uma pressão negativa sobre as relações comerciais e financeiras com os EUA.
Isso, diz eles, poderia exacerbar a fragilidade do real e aumentar as preocupações sobre a sustentabilidade fiscal do Brasil, resultando em um cenário menos favorável para os investimentos. A falta de clareza nas políticas econômicas de Trump, conforme os especialistas do banco, pode dificultar a avaliação do impacto sobre o Brasil, criando um ambiente de volatilidade.
Algumas ações que podem se dar bem com a vitória de Trump, segundo o Morgan:
JBS (JBSS3) – a empresa pode se beneficiar do fortalecimento das exportações de carne, mas também pode enfrentar desafios se houver barreiras comerciais.
Petrobras (PETR4) – poderia ver sua situação financeira melhorar com a recuperação nos preços das commodities energéticas, especialmente se as políticas de Trump favorecem a indústria de energia.
Itaú Unibanco (ITUB4) – um dos maiores bancos do Brasil, poderá se beneficiar de um aumento no consumo e no crédito, embora a incerteza econômica possa afetar sua performance.
Wal-Mart do México – a performance do Wal-Mart no México pode ser impactada por políticas protecionistas de Trump, afetando indiretamente o Brasil.
Com informações do InfoMoney.
Foto: Bloomberg.