Home Brasil A Vaza Jato faz história – de novo

A Vaza Jato faz história – de novo

17 de maio de 2023, 17h20 | Por Redação ★ Blog do Lindenberg

by Redação ★ Blog do Lindenberg

Por The Intercept_ Brasil

Olá,

Num certo domingo de 2019, um jovem procurador da República provavelmente curtia aquela moleza do fim de domingo em família, quando despertou de seus sonhos mais tranquilos.

A Vaza Jato caiu como uma bomba no colo de Deltan Dallagnol, e as consequências dela o perturbam até hoje. Quase quatro anos depois da publicação das nossas primeiras reportagens, o ex-procurador perdeu seu mandato de deputado federal e este parece ser o epílogo de sua nefasta trajetória como figura relevante na política e no debate público brasileiro.

A perda do mandato do deputado se deu porque o TSE tornou inválido o registro de sua candidatura. Deltan foi cassado por conta da Lei da Ficha Limpa. Quando se retirou do Ministério Público para ser candidato, meses antes do prazo limite, tramitavam contra ele 15 procedimentos administrativos no Conselho Nacional do Ministério Público.

O TSE entendeu, por unanimidade, que o ex-chefe da Lava Jato pediu exoneração para escapar das punições que o tornariam inelegível. Ao deixar o MP, os processos extinguiram-se automaticamente. Pode parecer que não há relação direta com a Vaza Jato, mas saiba disso: até a publicação de nossas reportagens, Deltan tinha apenas 11 procedimentos administrativos em andamento. Só em 2019, após aquele domingo intranquilo, Deltan passou a responder em mais 23 procedimentos, entre eles as acusações mais graves e fundadas.

A despeito da ironia que é um papagaio do proselitismo “anti-corrupção” ser pego no contrapé pela Lei da Ficha Limpa por conta de uma falcatrua para escapar de uma série de investigações, há aspectos bastante relevantes nessa história.

Como disse, a decisão do TSE pode não ter ligação direta com a Vaza Jato, mas você pode ter certeza que não teria acontecido sem as revelações. Mas há algum tempo sabemos que um dos grandes impactos da série de reportagens publicadas pelo Intercept foi interromper uma onda perigosíssima que havia se abatido sobre o Brasil. A operação e seus líderes tornaram-se unânimes. Não havia espaço para críticas ou contraditório. Figuras como Deltan manipulavam a opinião pública, a imprensa e até os tribunais com tanta facilidade que parecia haver um consenso inabalável em torno de si.

A Vaza Jato, ao expor o conluio entre acusação e juiz, ao revelar os ganhos pessoais, as motivações espúrias, a falta de decoro e princípios do ex-procurador e sua turma, interrompeu os sonhos tranquilos de Curitiba. A partir daquele domingo, 9 de junho, eles seriam cobrados pública e juridicamente por seus atos. Como deve ser sempre no trato da coisa pública.

Numa das reportagens mais simbólicas da Vaza Jato, contamos sobre uma palestra secreta que Deltan deu para a XP Investimentos na presença de banqueiros investigados pela Lava Jato. Seus colegas questionaram no Telegram se aquilo era certo, afinal, o ex-procurador deveria cuidar de sua imagem para preservar a operação. Bem diferente da imagem pública que costuma cultivar falando sempre em Deus e serviço ao Brasil, a resposta de Deltan é emblemática: “Achamos que há risco sim, mas que o risco tá bem pago rs”.

Ou seja, o agora ex-deputado federal sempre soube que o que estava fazendo era errado, porém um risco bem pago. Amealhou um bom patrimônio surfando na onda anti-corrupção que ajudou a criar, utilizando o Ministério Público como palanque. Correu novo risco ao candidatar-se em 2022, mas esse também foi bem pago. Afinal, os processos aos quais deveria responder desapareceram de uma só vez.

Agora, há algo importante a ser celebrado: aquele herói proselitista de 2019 não existe mais.

E isto tem muito a ver comigo, com você e a comunidade do Intercept. Em junho daquele ano, éramos cerca de 2.000 pessoas unidas em prol do jornalismo independente. A verdade é que o TIB era bem pouco conhecido. Teve gente que leu as reportagens naquele domingo e desconfiou porque nunca tinha ouvido falar do site. O que torna a coisa toda ainda mais incrível, não? Éramos jornalistas-Davi contra procuradores-Golias.

Foto: ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA//Estadão Conteúdo

LEIA TAMBÉM

Envie seu comentário