Em carta enviada em dezembro ao então ministro da Saúde Eduardo Pazuello, a Pfizer propôs soluções para entraves que, segundo o governo federal, impediam a compra da vacina da empresa.
Por G1
A carta faz parte de documentos enviados pela farmacêutica à CPI da Pandemia e foi obtida pela TV Globo. Correspondência semelhante foi endereçada ao então secretário-executivo da pasta Élcio Franco no mesmo dia.
O presidente da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, então presidente da companhia no Brasil, afirmou na carta que a empresa havia adequado as limitações jurídicas, encontrado alternativas logísticas e que a oferta, apesar de limitada, seria suficiente para imunizar grupos prioritários ainda no primeiro trimestre. A empresa enviou pelo menos dez e-mails ao Governo sobre vacinas.
Ao secretário Élcio Franco, Murillo explicou a motivação para suas declarações.
“Deixamos inúmeras mensagens em seu gabinete e também reforçamos o pedido por e-mail. Como ainda não tivemos retorno, gostaria de comentar alguns pontos relacionados ao tema e também a cobertura de imprensa realizada ontem, com base em coletiva do Ministério da Saúde que falava do perfil ideal de uma vacina contra a COVID-19”, escreveu.
Em entrevista coletiva em 1º de dezembro, dia anterior ao envio das cartas, o secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Medeiros, disse que o perfil ideal de um imunizante para o Brasil seria uma vacina que pudesse ser armazenada entre 2º e 8ºC e, preferencialmente, de dose única.
Murillo respondeu dizendo que a Pfizer apresentou embalagem especial para armazenamento da vacina por até 15 dias a partir da troca de gelo seco.
“Consideramos, como tem sido com todos os outros países que vão começar a vacinação, que são esquemas muito viáveis e de efetiva implementação considerando inclusive as características geográficas e climáticas do país.”
O executivo também disse que a farmacêutica conseguiu “adequar as limitações de ordem jurídica que foram compartilhadas conosco a partir de nossa segunda proposta”.
“Um dos pontos mais relevantes foi estabelecer a condição para o contrato definitivo à emissão do registro sanitário pela Anvisa”, afirmou.
Sobre as declarações de que a Pfizer destinou quantitativo pequeno para o Brasil, Murillo disse que a quantidade de doses ofertadas permitiria “cobrir grupos prioritários e de maior risco”.
“Se por um lado entendemos que o quantitativo disponível para o Brasil para o primeiro semestre é limitado e não permitirá vacinar o [sic] maioria da população com nossa vacina […], afirmamos que esse quantitativo permite sim cobrir grupos prioritários e de maior risco, inclusive já no primeiro trimestre, o que faz ainda mais viável a implementação logística, dado que estamos falando de grupos mais reduzidos e concentrados majoritariamente em grandes cidades”, disse.
Por fim, o executivo respondeu sobre a condição de não responsabilização futura da Pfizer e disse que o termo tinha sido aceito “por todos os países que já fecharam acordo” com a empresa.
“A condição de não responsabilização futura para a Pfizer sobre possíveis demandas litigiosas futuras tem sido praxe e aceita por todos os países que já fecharam acordo com a Pfizer.”
Na carta, o presidente da empresa na América Latina afirmou que o Brasil precisava assinar o Memorando de Entendimento até 7 de dezembro ou as doses reservadas para o Brasil seriam endereçadas a outros países da região que já haviam assinado o contrato.
Íntegra da carta
Excelentíssimo Senhor Ministro Eduardo Pazuello,
Data a extrema importância deste tema para o país e para seus cidadãos, permita-me enviar essa comunicação ao senhor para assegurar que receba diretamente de nossa parte nosso posicionamento em relação às tratativas com o Governo Brasileiro sobre nossa vacina contra a COVID-19
Em nossa terceira oferta enviada ao Governo Brasileiro na semana passada, em 24 de novembro, conseguimos adequar as limitações de ordem jurídica que foram compartilhadas conosco a partir de nossa segunda proposta. Um dos pontos mais relevantes foi estabelecer a condição para o contrato definitivo à emissão do registro sanitário pela ANVISA.
Temos reforçado que a data limite de 7 de dezembro, que a matriz da companhia autorizou em caráter excepcional para o Brasil, para ter assinado este novo Memorando de Entendimento Não Vinculativo, é fundamental. Caso não tenhamos esse documento assinado, nesta data as doses reservadas para o Brasil para o primeiro e segundo trimestre de 2021 serão disponibilizadas para outros mercados da região que já tem contrato assinado com a Pfizer.
Tendo isso em vista, solicitamos ao Ministério da Saúde, pela urgência do tema, que se os senhores já tiverem tomado decisão de não avançar com a assinatura deste documento, possam nos comunicar para que possamos liberar essas doses para que elas sejam disponibilizadas aos países da região que estão trabalhando em seus planos de vacinação que irão começar nos próximos dias, sujeitos a aprovação regulatório [sic] desses países.
Apresentamos, fisicamente, a embalagem especial desenvolvida para esta vacina que permite armazenamento por até 15 dias, na temperatura necessária, com a troca de gelo seco, e por mais 5 dias em refrigerador comum, e também encaminhamos 3 propostas iniciais de esquemas possíveis de distribuição de vacinação, para a partir da assinatura do acordo pelo Ministério serem revisadas e ajustadas. E consideramos como tem sido com todos os outros países que vão começar a vacinação, que são esquemas muito viáveis e de efetiva implementação considerando inclusive as características geográficas e climáticas do país.
Se por um lado entendemos que o quantitativo disponível para o Brasil para o primeiro semestre é limitado e não permitirá vacinar o [SIC] maioria da população com nossa vacina, da mesma forma que está sendo em outros países – como o Reino Unido que emitiu hoje a autorização regulatória para a Vacina da Pfizer/BioNtech e irá começar a vacinação já na próxima semana, afirmamos que esse quantitativo permite sim cobrir grupos prioritários e de maior risco inclusive já no primeiro trimestre, o que faz ainda mais viável a implementação logística, dado que estamos falando de grupos mais reduzidos e concentrados majoritariamente em grandes cidades.
A condição de não responsabilização futura para a Pfizer sobre possíveis demandas litigiosas futuras tem sido praxe e aceita por todos os país que já fecharam acordo com a Pfizer.
Temos buscado, nesta semana, e continuamos tentando contato com o Secretário Elcio Franco para poder avançar com este Memorando de Entendimento e assim conseguir iniciar a vacinação de brasileiros após a aprovação da ANVISA e formalização de contrato definitivo.
Se possível, gostaria muito de poder me reunir com o senhor para conversar pessoalmente sobre esse tema.
Atenciosamente,
Carlos Murillo
Foto: montagem