Por CNN
Ao declarar que escolherá o general Braga Netto para vice em sua chapa, Jair Bolsonaro (PL) reforça o discurso de linha-dura, reforça a aliança com seu dispositivo militar, tenta resgatar a imagem de político antissistema, faz uma espécie de vacina anti-impeachment (não crê que um militar seja capaz de conspirar para derrubá-lo e herdar seu cargo) e joga para a plateia bolsonarista.
Quando descarta a entrega do cargo de vice a um político — no caso, a deputada e ex-ministra Tereza Cristina (PP-MS) –, o presidente evita colocar mais uma cereja no bolo do Centrão, a última que falta para terminar a decoração do confeito preparado pelos caciques que controlam o governo e garantem sua sobrevivência.
Ao propor uma edição revista e atualizada da chapa que o levou ao Planalto, Bolsonaro tenta repetir 2018 e aposta no empoderamento e no entusiasmo de seu eleitorado mais radical, um núcleo duro que, a exemplo do que ocorreu há quatro anos, seria capaz de contaminar outros setores da sociedade.
O problema que, como revelam pesquisas, ele tem tido dificuldades para ampliar apoios fora desta bolha, que reúne um número significativo de cidadãos.
O último Datafolha mostra que o ex-presidente Lula (PT) tem 37% das preferências no voto espontâneo e 47% na pesquisa estimulada, quando o pesquisador mostra a lista possíveis candidatos ao entrevistado.
Ou seja, o petista sobe dez pontos percentuais entre as duas formas de consulta, o que indica uma boa capacidade de agregar o eleitor que não é petista ou lulista de carteirinha, que não tem um voto aparentemente consolidado.
Já Bolsonaro teve 25% de citações espontâneas e 28% na pesquisa estimulada: ganhou apenas três pontos percentuais entre uma pergunta e outra. Estes três pontos representam um crescimento de 12% em suas intenções espontâneas de voto; os dez pontos adicionais de Lula revelam um aumento de 27% em seu possível eleitorado.
Ao manter e reativar o discurso radical, Bolsonaro reforça sua base, mas dificulta a adesão de outros eleitores. Há quatro anos, a postura extremista deu resultado num país convulsionado — o eleitor não queria saber de moderação.
Candidato de um partido então nanico, quase sem tempo de TV, ele incorporou o papel de justiceiro, de contra tudo o que representavam os políticos.
O problema para Bolsonaro é que o país mudou.
Há quatro anos, o antipetismo estava no auge, o combate à corrupção dominava as conversas e preocupações, algo superado, hoje, pela angústia provocada pelos diversos sintomas da crise econômica — inflação, fome, desemprego, preços de combustíveis.
A aliança com o Centrão e os recentes escândalos no governo também indicam que não seria bom para o presidente insistir em se apresentar como um estranho no ninho político e como porta-voz do discurso contra a roubalheira, ele não está mais no confortável papel de quem só joga pedras, tem vidraças a defender.
Ao longo de seu mandato de presidente, Bolsonaro até ensaiou adotar posturas mais moderadas, tentativas que não resistiram por muito tempo.
O presidente que construiu sua longa carreira no campo minado do radicalismo indica, com a escolha de Braga Netto, que resolveu dobrar a aposta, como um ator que repete as falas e ignora que a peça tem outros atores e um novo cenário.
Foto: Clauber Cleber Caetano/PR