Home Comentários É grande o risco de confusão entre interesses de Estado e interesses de família

É grande o risco de confusão entre interesses de Estado e interesses de família

14 de julho de 2019, 22h02 | Por Carlos Lindenberg

by Carlos Lindenberg

Pode ser um balão de ensaio. Daquele tipo, se colar…colou. Mas objetivamente, ninguém sabe. Nem o pai disse que vai fazer nem o filho renunciou ao mandato. Estou falando do boato ou que nome tenha de o presidente Jair Bolsonaro ter dito na semana passada que está pensando em fazer do seu filho, o deputado por São Paulo, Eduardo Bolsonaro, o mais votado do país nas últimas eleições, embaixador do Brasil nos Estados Unidos, a mais importante representação diplomática brasileira em todo o globo.

O anúncio, ou o balão de ensaio, repercutiu mal entre os próprios seguidores e partidários do presidente Jair Bolsonaro. Um dos que criticaram a possível decisão foi o escritor Olavo de Carvalho, o guru da família Bolsonaro. Olavo de Carvalho disse que a tarefa de embaixador seria incompatível com uma certa missão de Eduardo dada pelo seu pai, que seria a criação de uma CPI na Câmara sobre o foro de São Paulo – uma ideia cultivada por setores da direita segundo a qual o foro, criado em 1990, é uma organização política de esquerda com ação em toda a América do Sul. Mas o próprio Olavo se põe sob suspeição por que no início do governo Bolsonaro ele disse, sem que lhe perguntassem, que aceitaria o posto de embaixador brasileiro nos Estados Unidos.

Mas a reação não coube apenas a Olavo de Carvalho. A deputada estadual Janaina Paschoal, célebre por ter assinado o pedido de impeachment da então presidente Dilma Rousseff, também criticou o anúncio – ou balão de ensaio – perguntando se seria certo o deputado Eduardo Bolsonaro abandonar os quase dois milhões de eleitores que teve em São Paulo e assumir a embaixada brasileira em Washington. Abre aspas para Janaina “ninguém me perguntou, mas eu digo que não”, fecha aspas, disse Janaina sobre a ideia de Eduardo Bolsonaro renunciar ao seu mandato para ser embaixador. A deputada do PSL Carla Zampeli é a voz discordante. Ela aprova a ideia.

Ideia que é combatida também pelo diplomata Rubens Ricúpero, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, para quem se trata de uma medida sem precedentes na tradição diplomática brasileira e na história diplomática de países civilizados e democráticos. E diz que nomeação de parentes próximos para funções diplomáticas é típica de monarquias absolutas ou de governantes populistas como Donald Trump, abre aspas “que só confiam na sua própria família” fecha aspas. Para Rubens Ricúpero, situações assim abrem possibilidades para que negociações típicas de Estado se confundam com interesses pessoais ou de família. O problema fica maior quando se ouve dizer que o presidente Bolsonaro veria também com bons olhos que um filho de Mauricio Macri, presidente da Argentina, fosse nomeado embaixador no Brasil. O atual chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, nomeado por Bolsonaro, no entanto, acha que Eduardo seria um excelente embaixador nos Estados Unidos. O deputado Eduardo Bolsonaro acabou sendo vítima de piadas nas redes sociais por ter dito supostamente que fala inglês muito bem e que trabalhou fritando sanduiches nos Estados Unidos. Já o presidente Bolsonaro destaca que o filho tem boas relações com os filhos de Donald Trump. Corre-se aí o risco apontado por Rubens Ricupero, de as relações se tornarem pessoais ou familiares em prejuízo dos interesses do país. Nesta semana se saberá se se trata de um balão de ensaio ou se a ideia é mesmo pra valer.

 

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