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Damares agiu para impedir aborto legal de criança de 10 anos, diz jornal Após negativa de médicos no Espírito Santo, menina que foi estuprada e engravidou do tio precisou fazer o procedimento em Recife.

21 de setembro de 2020, 16h19 | Por Letícia Horsth

by Letícia Horsth

A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, teria agido para impedir o aborto legal de uma menina de 10 anos, que engravidou após ser estuprada pelo tio, no Espírito Santo. A informação é do jornal Folha de S.Paulo, em reportagem publicada nesta segunda-feira (21).

O caso ganhou projeção nacional após mobilização pessoal da ministra e pessoas ligadas a ela, como a extremista de direita Sara Giromini, responsável pela divulgação do nome da vítima e do endereço do hospital onde o aborto foi feito, além da incitação de que militantes comparecessem ao local e constrangessem a menina a desistir da interrupção da gravidez.

De acordo com a reportagem, uma operação orquestrada pela ministra teria o objetivo de levar a criança da cidade de São Mateus, onde vivia, para um hospital em Jacareí, no interior de São Paulo. No local, a menina aguardaria a evolução da gestação e teria o bebê, apesar do risco para a vida da vítima.

Damares teria enviado para São Mateus (ES) dois assessores e políticos aliados, como Lorenzo Pazolini (Republicanos). A explicação oficial era que eles acompanhariam de perto o caso, mas na prática, segundo o jornal, atuaram para evitar o procedimento que é garantido pela Constituição.

Os assessores se reuniram com integrantes do Conselho Tutelar da cidade e com integrantes da prefeitura. Nos encontros, de acordo com a publicação, chegaram a fazer propostas de melhorias nos atendimentos caso tivessem seus pedidos atendidos.

A reportagem da Folha mostra que a ministra esteve diretamente envolvida nessas tentativas de dissuadir a família e chegou a participar de uma reunião por Zoom com essa finalidade.

Interromper a gravidez é um direito garantido pela lei brasileira no caso de estupro da vítima. A menina vinha sendo abusada por um tio. A legislação também permite aborto legal quando a gravidez oferece risco à vida, o que também foi o caso da menina, que corria riscos naturais ao prosseguir com a gestação porque só tinha 10 anos.

No fim, a família da criança conseguiu garantir que ela realizasse o procedimento. Embora a criança seja do Espírito Santo, da cidade de São Mateus, a operação foi realizado em Recife (PE), depois que médicos capixabas se negaram a fazer o aborto. Houve, segundo a reportagem, ao menos uma tentativa de atrasar a alta da menina do hospital onde ela estava, o que faria com que perdesse o voo para Recife.

Fracassada a tentativa, os envolvidos com a ministra teriam sido os responsáveis por vazar a identidade da criança e do hospital que realizaria o procedimento para a ativista de extrema direita Sara Fernanda Giromini, que divulgou os dados pessoais da vítima nas redes sociais.

Devido à grande presença de manifestantes contrários ao aborto, a menina teve de entrar no hospital escondida no porta-malas de um carro.

O suspeito do crime foi preso no dia 18 de agosto, em Betim (MG). Ele foi ouvido pela polícia e teria confessado “informalmente” os abusos cometidos.

Desde que o caso do estupro foi relevado, no começo de agosto, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos começou a manter contato com membros do conselho tutelar da região, como revelam as fontes ouvidas pela Folha.

Um dia depois do primeiro contato, em seu Twitter, a ministra Damares chegou a anunciar que estava “acompanhando o caso” e que o Ministério estava fazendo contatos na região. Mas suas mensagens não especificaram que o objetivo era evitar ou impedir o aborto.

A exposição da criança menor de idade, como foi feita após o vazamento das informações na internet, também vai contra o Estatuto da Criança e do Adolescente.

O deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) protocolou um pedido de convocação para que a ministra explique no Congresso a atuação de seus assessores no caso. Ele questiona ainda se a ministra se utiliza dos conselhos “para perseguir os servidores públicos que cumprem a lei”.

Questionado, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos negou as informações divulgadas pelo jornal.

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

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