Por Folha de S.Paulo
O grupo terrorista Hamas escondeu alguns de seus integrantes em ambulâncias que transportavam feridos da Faixa de Gaza para o posto de fronteira de Rafah, levando o Egito a fechar novamente a passagem inclusive para estrangeiros autorizados a usá-la.
Com isso, as 34 pessoas à espera de repatriação ao Brasil em Gaza encaram mais um possível adiamento. Elas já não haviam sido incluídas na sexta leva de permissões para deixar o território na manhã desta quarta (8), que tinha favorecidos da Ucrânia (228 cidadãos), Filipinas (107), Estados Unidos (100), Alemanha (75), Romênia (51) e Canadá (40).
O incidente, segundo pessoas com conhecimento do assunto em Tel Aviv e no Cairo, irritou os dois governos, que vêm coordenando os esforços para a retirada de feridos mais graves na campanha israelense contra o Hamas, que governa Gaza desde 2007 e iniciou uma guerra contra o Estado judeu há um mês.
No sábado (4), o Egito já havia suspendido a saída após Israel alvejar uma ambulância sob a alegação de que ela transportava terroristas. O Hamas nega, e diz que 15 civis morreram na ação. Seja como for, foi costurado um novo acordo e, a partir da segunda (6), as ambulâncias passaram a ser acompanhadas pelo Crescente Vermelho/Cruz Vermelha na região.
Na terça (7), as listas com autorizações para estrangeiros voltaram a ser emitidas. Nesta quarta, ainda não está claro o momento em que foi notada a presença de infiltrados do Hamas entre os feridos, mas o clima azedou novamente naquilo que o Departamento de Estado dos EUA chamou de “incidente de segurança”.
O embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zohar Zonshine, divulgou uma nota nesta tarde de quarta em que aludia à questão, sem citar o episódio em detalhes. “O Hamas está fazendo uso cínico da população civil estrangeira no meio da guerra e impediu estrangeiro”, afirmou.
O comunicado visava responder a críticas da esquerda de que o país estaria retaliando o Brasil por sua conduta à frente do Conselho de Segurança da ONU em outubro, que buscou soluções de consenso que desagradaram Israel.
“O Estado de Israel está empregando esforços para evacuar todos os estrangeiros de 20 países diferentes e para aumentar a cota de forma a compensar o atraso causado pelo Hamas”, afirmou. Seu relato, ainda que sem detalhes, bate com o feito por pessoas na região.
Tudo indica que a suspensão possa cair já nesta quinta (9). Seja como for, o anúncio de que o Brasil estava fora da lista foi particularmente dolorido para o grupo sob proteção do Itamaraty, como o comerciante de São Paulo Hasan Rabee, 30, que na véspera havia postado no Instagram uma mensagem otimista, prevendo sua saída para esta quarta.
Ele aparentemente se baseava na promessa feita pelo chanceler israelense, Eli Cohen, a seu colega brasileiro, Mauro Vieira, na sexta (3). O problema, contudo, foi o fechamento da fronteira no sábado.
Ao todo, contando o anúncio desta quarta, cerca de 4.100 pessoas já receberam esses passes, mas não os brasileiros.
O fato é que as autorizações são complexas, passam por quatro países com voz final do Egito, e o Brasil não é exatamente um ator regional importante. Considerando o prazo dado por Cohen, é possível especular que a solução para o caso dos brasileiros se encontre no fim desta semana, caso a situação volte ao normal.
Os refugiados brasileiros estão em dois grupos, um de 18 em Rafah e outro, de 16, em Khan Yunis, a 10 km de lá. Eles relatam dificuldades diárias para viver, e os bombardeios de Israel seguem constantes nas cidades.
Enquanto isso, a Embaixada do Brasil no Cairo prepara a recepção aos refugiados, que receberão atenção médica antes de embarcar no voo de volta em um VC-2, a versão de transporte presidencial do Embraer-190. O avião está no Cairo.
Até aqui, foram repatriados na crise 1.410 brasileiros e 3 bolivianos de Israel, além de 32 brasileiros da Cisjordânia, a outra metade do Estado palestino que nunca veio à luz de forma plena após os acordos de Oslo, em 1993. Em 2007, o Hamas tomou Gaza para si, cristalizando a divisão entre os árabes da região.
Foto: Mahmud Hams – 7.nov.2023/AFP