A fábrica de células de baterias de lítio-enxofre da empresa Oxis Energy será mesmo instalada em Juiz de Fora (Zona da Mata), apesar de a maior mina de extração de lítio do Brasil estar em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha. Diante do fato, parlamentares, moradores da região do Vale e especialistas cobram do Governo do Estado investimentos imediatos para que a região possa participar de toda a cadeia produtiva do lítio, de modo a gerar mais desenvolvimento e renda para as comunidades locais.
O assunto foi debatido durante audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (9).
A principal explicação dada pelo governo para a escolha de Juiz de Fora tem a ver com a localização geográfica da cidade, isso porque o lítio a ser utilizado na fábrica virá do Reino Unido, via porto do Rio de Janeiro. As células de bateria utilizam o lítio metálico, item que ainda não é produzido pela Companhia Brasileira de Lítio (CBL), que explora a mina em Araçuaí, desde o início da década de 90.
Justificativa – Segundo o titular da Secretaria de Estado Adjunta de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Fernando Passalio Avelar, transportar o lítio metálico até o Jequitinhonha seria perigoso, daí a escolha da empresa por Juiz de Fora, que também fica próximo aos principais mercados consumidores, que seriam Rio, São Paulo e Belo Horizonte.
De acordo com Fernando, a fábrica de Juiz de Fora começará suas operações em 2023, produzindo 300 mil células de bateria por ano e gerando 100 empregos diretos.
O metal lítio é utilizado em uma variada gama de produtos, na indústria farmacêutica, na composição de tintas e graxas e até em componentes para usinas fotovoltaicas e nucleares, passado pelas baterias elétricas. Segundo especialistas, o mercado é ainda mais promissor com o desenvolvimento dos carros elétricos. A CBL produz principalmente o carbonato de lítio e o hidróxido de lítio.
O diretor superintendente da CBL, Vinícius Alvarenga, explicou que o lítio metálico, que será usado para as baterias, é feito a partir do carbonato de lítio, mas que o processo para isso é bastante complexo. Segundo ele, a tecnologia que a Oxis utilizará ainda está sendo testada. “Estamos estudando uma forma segura e limpa de produzir aqui o lítio metálico”.
Conforme explicou Vinícius, o modo como a China desenvolve o lítio metálico, por exemplo, provavelmente não seria permitido aqui no Brasil, porque envolve muitos riscos ambientais. “Nos comprometemos a continuar pesquisando para desenvolver tecnologias e riquezas para essa região”, afirmou. A companhia é de origem brasileira e teve uma parte recentemente comprada pela Codemig.
Lítio motiva discussão sobre desenvolvimento do Vale
A audiência foi conduzida pelo presidente da comissão, deputado Doutor Jean Freire (PT), e teve a participação presencial e remota de convidados e diversos outros parlamentares. Vários deles, como Marquinhos Lemos (PT), Carlos Henrique (Republicanos) e Gustavo Santana (PL) destacaram a necessidade de implementação do Plano de Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha e a urgência de rever as ações do governo na região.
“Há muitos estudos sobre o Vale, agora precisamos de projetos que saiam do papel”, destacou Doutor Jean Freire, que defende a rediscussão de toda a cadeia produtiva do lítio que sai de Araçuaí. Ele destacou, ainda, outras possíveis fontes de desenvolvimento do Vale como o artesanato e a fruticultura.
O deputado André Quintão (PT) foi enfático: “Ouvimos as motivações técnicas para a não implementação da fábrica em Araçuaí, mas tem que haver uma ação do Estado também para levar novas oportunidades para o Jequitinhonha. Não podemos ficar sempre a mercê da lógica do mercado e do lucro das empresas”.
“Se a distância dos grandes centros for um impedimento para a instalação de empresas, então o semi-árido nunca terá oportunidades de se desenvolver”, questionou a deputada Leninha (PT).
O deputado Guilherme da Cunha e a deputada Laura Serrano, ambos do partido Novo, destacaram as vantagens da instalação da fábrica da Oxis em Minas, seja ela em Juiz de Fora ou em qualquer outra região do Estado. “O que precisamos fazer é discutir as potencialidades regionais e vantagens competitivas de cada região”, afirmou Guilherme da Cunha.
Requerimentos – Ao final da reunião, foram aprovados requerimentos, a maioria do deputado Doutor Jean Freire, propondo realizações de audiências para aprofundar o debate sobre o tema. Também foi aprovado requerimento a ser encaminhado à ALMG, propondo a criação de Comissão Especial do Lítio Mineiro.
Um dos requerimentos, endereçado à CBL e à Sigma, pede providências para que seja viabilizada parceria de desenvolvimento tecnológico na área de geologia e mineração com o Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG) e com a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).
Moradores sofrem em região rica de recursos
O professor Adjunto do Curso de Engenharia Geológica da UFVJM, José Maria Leal, foi um dos que destacaram a necessidade de investimentos para que a região avance e se desenvolva.
“Nossa região também é rica em silício, que pode ser usado em cerâmicas e fibras óticas, por exemplo. Nossa universidade tem condições de fazer pesquisa para desenvolver tudo isso. Mas onde estão os recursos para a pesquisa?”, lamentou. Segundo ele, a região vive um paradigma, porque é muito rica em recursos, mas a maioria das pessoas vive na pobreza.
A representante do movimento “O Lítio é do Jequitinhonha”, Joyce Viana Prates, reivindicou do governo, da CBL e da Mineração Sigma (que também já tem licenças para explorar o lítio na região) ações ambientais e socioeconômicas para ajudar a população do Vale. Ela destacou que as comunidades convivem com riscos ambientais, uma vez que o local onde é feita a extração de lítio também é a região que abastece o lençol freático, na bacia do rio Araçuai.
“Mesmo com toda a riqueza natural da região, continuamos nos sentindo como mendigos sentados em sacos de ouro”, lamentou.
Foto: Willian Dias/ALMG
Fonte: ALMG