Home Internacional Mais de 100 jornalistas mortos em 30 anos: conheça os riscos à imprensa na Rússia e nas Filipinas, de onde vêm os ganhadores do Nobel da Paz

Mais de 100 jornalistas mortos em 30 anos: conheça os riscos à imprensa na Rússia e nas Filipinas, de onde vêm os ganhadores do Nobel da Paz Mais de 100 jornalistas mortos em 30 anos: conheça os riscos à imprensa na Rússia e nas Filipinas, de onde vêm os ganhadores do Nobel da Paz

8 de outubro de 2021, 17h50 | Por Redação ★ Blog do Lindenberg

by Redação ★ Blog do Lindenberg

Por G1

Em quase três décadas, ao menos 145 jornalistas foram mortos na Rússia e nas Filipinas durante o exercício da profissão, informou nesta sexta-feira (8) o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ).

O informe foi feito logo após o Nobel da Paz premiar a jornalista filipina Maria Ressa e o russo Dmitry Muratov por suas “vozes críticas contra o autoritarismo e a desinformação”.

Segundo a organização internacional que presta apoio para profissionais em áreas de risco, nos dois países em que trabalham dos vencedores do prêmio, a situação é grave.

Nesta reportagem, o g1 mostra as dificuldades que jornalistas enfrentam e quais são as ameaças para a liberdade de imprensa em cada um dos dois países dos ganhadores do Nobel.

Maria Ressa e Dmitry Muratov, jornalistas vencedores do Nobel da Paz — Foto: Isaac LAWRENCE, Yuri KADOBNOV / AFP

145 mortes desde 1992

O informe do CPJ revelou que desde 1992, quando começaram a contabilizar os dados, foram ao menos 145 jornalistas mortos enquanto trabalhavam nas Filipinas e na Rússia.

Ainda segundo o comitê, na última década, aumentou o número de ataques a profissionais da imprensa nos dois países, que estão também entre os que têm maior impunidade para esse tipo de crime.

Em três décadas, 58 jornalistas foram mortos por fazer seu trabalho na Rússia. O número é ainda maior nas Filipinas, com 87 profissionais da imprensa assassinados.

O CPJ destaca a gravidade do episódio conhecido como o massacre de Maguindanao, em 2009, que resultou na morte de 32 jornalistas filipinos no ataque mais mortal contra profissionais da imprensa no mundo (leia mais adiante).

Alta impunidade

No relatório intitulado “Getting Away with Murder” (Se livrando de assassinato, em tradução livre) a entidade lista os países em que mais crimes contra jornalistas ficaram impunes.

As Filipinas ocupam o 7º lugar neste ranking, com 11 casos não resolvidos. Já a Rússia figura no 11º lugar, com 6 casos. Na contagem, o Brasil também aparece entre as nações com alta impunidade.

Colado nas Filipinas, o Brasil está na 8ª posição com 15 casos não resolvidos. O cálculo da CPJ leva em conta o número de mortes em comparação com a população, por isso o Brasil – com mais casos – está atrás do país das Filipinas, e não o contrário.

Massacre de Maguindanao

Exército filipino contribuiu com as buscas pelas vítimas do massacre, foto de arquivo — Foto: Erik de Castro/Reuters/Arquivo

Citado pela CPJ como o mais mortal ataque contra profissionais da imprensa no mundo, o episódio conhecido como Massacre de Maguindanao terminou com a morte de 32 jornalistas nas Filipinas.

Em novembro de 2009, homens armados sequestraram 60 civis – entre eles jornalistas, advogados e políticos–, e os executaram em uma área remota da província de Maguindanao, no sul do país.

O Exército filipino precisou ser acionado para ajudar nas buscas pelos corpos, que foram enterrados em covas não identificadas.

O ataque estava relacionado às eleições regionais que aconteceriam no ano seguinte. Um ex-governador foi apontado como um dos mandantes do crime, que teve motivação religiosa e política.

A guerra às drogas de Duterte

Mais recentemente, sob o governo de Rodrigo Duterte, as Filipinas organizam uma verdadeira guerra às drogas, contra traficantes e usuários, no país.

A dura repressão, com execuções sumárias, é criticada pela comunidade internacional, pela imprensa e opositores.

Por conta de sua cobertura contrária às execuções – que seriam muitas vezes ilegais e escondidas em ações policiais –, Ressa, que levou o Nobel, sofre uma campanha de perseguição do governo do país.

Rodrigo Duterte, presidente das Filipinas, durante campanha eleitoral em abril de 2016 — Foto: Erik de Castro/Arquivo/Reuters

O Rappler, portal de notícias da jornalista filipina, publicou reportagens sobre os assassinatos de pessoas suspeitas de usarem drogas e revelou o uso fake news pelo governo de Duterte.

“Rappler deu atenção à campanha assassina do regime de Duterte. O número de mortes é tão alto que parece uma guerra contra a própria população do país”, afirmou a porta-voz do Nobel, Berit Reiss-Anderson.

Ressa já foi processada por conta do seu trabalho, e também recebeu ataques de aliados do governo — um desses, o jornal “The Manila Times” de Dante A. Ang, amigo pessoal de Duterte.

A publicação a acusou, sem provas, de pertencer a um grupo que planeja um golpe contra o presidente filipino que vinha considerando se candidatar à reeleição – o que não é permitido pela Constituição.

Ele desistiu após críticas da população e decidiu se retirar da vida política. Especula-se, agora, que ele tentará fazer com que a filha, Sara Duterte-Carpio, concorra ao cargo.

Na Rússia, jornalistas viram ‘agentes externos’

O governo da Rússia tem uma lista de 85 jornalistas ou veículos de imprensa que foram classificados como “agente externos”.

Em 2012, o país adotou uma lei que já foi alterada diversas vezes, mas na essência permanece a mesma: os veículos que entram para a lista passam a ter que submeter seus balanços a uma auditoria, precisam informar quais foram as informações que receberam de pessoas de fora da Rússia e sofrem uma série de restrições, de acordo com o CPJ.

Se o veículo de imprensa não observar essas regras, está sujeito a multas.

Nos últimos meses, o governo chegou a ordenar batidas policiais nas casas de repórteres importantes do país, de acordo com a agência de notícias Associated Press.

Mulher põe flor em memorial à jornalista russa Anna Politkovskaya, que cobria abusos na região da Chechênia quando foi morta em seu apartamento em Moscou, foto de arquivo — Foto: Pavel Golovkin/AP

Não são só empresas jornalísticas que enfrentam esse tipo de assédio do governo: organizações de direitos humanos enfrentam problemas semelhantes —duas delas fecharam as portas recentemente.

O governo da Rússia nega que esteja perseguindo a liberdade de imprensa, e afirma que a classificação de “agente externo” não impede os jornalistas de atuar.

A “Novaya Gazeta”, o jornal de Dmitry Muratov, um dos vencedores do Prêmio Nobel da Paz de 2021, é o principal veículo de imprensa independente que ainda não foi declarado um agente estrangeiro.

De 1993, quando foi fundado, até hoje, seis pessoas da sua redação foram mortos. Todas as mortes ocorreram depois que Vladimir Putin chegou ao poder na Rússia.

Uma das primeiras vítimas de assassinato da redação foi Yuri Shchekochikhin, que, além de repórter, era um parlamentar. Ele morreu em 2003 de uma doença misteriosa na pele —a “Novaya Gazeta” concluiu que foi um envenenamento. O repórter estava com viagem marcada para os Estados Unidos, onde iria participar de reuniões com agências de informação americanas.

O caso mais famoso, que foi citado na premiação do Nobel, é de 2006. Anna Politkovskaya, que fazia uma cobertura crítica do governo russo na Chechênia, foi assassinada. A morte dela foi interpretada como uma resposta ao seu trabalho. Ninguém foi condenado.

Em 2009, houve dois assassinatos: Anastasia Boburova, uma outra jornalista da “Novaya Gazeta”, foi assassinada a tiros na rua. E uma colaboradora do jornal, Natalia Estemirova, foi sequestrada e assassinada na Chechênia.

A “Novaya Gazeta” é tida como um jornal que frequentemente se choca com as autoridades da Rússia responsáveis pela lei.

Um dos donos do jornal é o ex-líder soviético Mikhail Gorbachev —aliás, para fundar a “Novaya Gazeta” ele usou o dinheiro do prêmio Nobel que ele mesmo venceu. Há outros donos, como um ex-agente da KGB (o serviço secreto soviético) que se tornou um banqueiro e a própria equipe, que também é sócia.

Envenenamento, prisão e morte de opositores

Em agosto de 2020, Alexander Navalny, o principal político de oposição a Vladimir Putin na Rússia, foi envenenado com uma substância chamada novichok, que foi fabricada na época da União Soviética.

Ele saiu do país para receber tratamento e voltou à Rússia no começo de 2021. Navalny foi preso imediatamente e depois condenado a uma pena de mais de 2 anos de prisão.

A polícia russa costuma prender milhares de protestos públicos nas cidades do país. A onda mais recente de manifestações aconteceu em resposta à prisão de Navalny.

Em 2015, Boris Nemtsov, um outro político de oposição que, na época, estava em ascensão, foi assassinado a tiros em Moscou.

Homem é detido pela polícia em ato pró-Navalny em São Petesburgo, em 21 de abril de 2021 — Foto: Anton Vaganov/Reuters

Vladimir Putin, o líder da Rússia desde 1999

Vladimir Putin foi nomeado primeiro-ministro da Rússia no fim de 1999. No dia 31 de dezembro de 1999, o então presidente, Boris Yeltsin, fez um pronunciamento pela TV no qual anunciou que Putin passaria a comandar o país.

Ele foi eleito presidente depois, mas há denúncias de fraudes —por exemplo, em 2012, houve eleições nas quais Putin saiu vencedor.

Observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa disseram que não havia competição real, pois os adversários mais competitivos foram impedidos de concorrer, e os aliados de Putin foram beneficiados com o dinheiro do governo.

Recentemente, Putin conseguiu fazer com que um projeto de lei fosse aprovado e referendado para poder permanecer no poder até 2036.

Foto: Bullit Marquez/AP

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