Olha, vem tempo quente aí – e não me refiro aqui às queimadas da Amazônia, que o governo nega, mas que a NASA comprova diariamente. A decisão ontem do ministro Rogério Schietti (foto), do Superior Tribunal de Justiça, considerando o atentado a bomba no Riocentro, em 1981, como imprescritível e que os militares envolvidos no atentado devem ser julgados por que cometeram um crime contra a humanidade, vai esquentar o ambiente político na sua área mais sensível: entre os militares que hoje estão no poder.
Segundo o ministro, o atentado não foi um ato isolado e ocorreu dentro de uma série de outros realizados contra entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Rio de Janeiro e contra a população civil. Aqui mesmo em Belo Horizonte, nessa época, ocorreram diversos atentados contra bancas de jornais e contra o Sindicato dos Jornalistas, contra a residência do médico e deputado federal Célio de Castro – depois, prefeito de Belo Horizonte – contra a casa do ex-delegado regional do Trabalho, Onésimo Viana, sem que se apurasse a responsabilidade de quem quer que seja. Até um ex-procurador geral de Justiça teria sido assassinado nessa época, vítima de uma trama engendrada nos elevadores do Fórum Lafaiete, crime também imprescritível se comprovada a materialidade do fato e a sua relação com o que disse ontem o ministro Rogério Schietti.
O caso da bomba no Riocentro, que o Ministério Público sustenta como um crime contra a humanidade, no bairro de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, na verdade foi uma tentativa fracassada de ataque a bomba durante um show comemorativo do Dia do Trabalhador, que reuniu mais de 20 mil pessoas. Segundo o MPF foi uma ação planejada por militares e tinha como objetivo criar um clima de pânico na sociedade brasileira para justificar – assim como os demais atentados – o recrudescimento da linha dura do regime. Os militares nunca admitiram a tese sustentada pelo MPF e acolhida ontem pelo relator Rogério Schietti, do STJ. Na explosão da bomba, que estava num carro Puma, morreu o sargento Guilherme do Rosário e ficou ferido o então capitão Wilson Dias Machado, que chegou a coronel, ambos Exército.
Por falar em casos assim, que lembram a época do arbítrio e agora quando se comemoram os 40 anos da anistia, o governador Romeu Zema está com um problema para resolver. Por ato do então governador Fernando Pimentel, o antigo DOPS, na avenida Afonso Pena, foi considerado uma espécie de museu das torturas. A polícia civil, que ocupava o prédio, já o desocupou e agora cabe ao governador Romeu Zema instalar lá o Memorial dos Direitos Humanos – A Casa da Liberdade. Até 1989, o prédio foi local de torturas e cárcere de presos políticos. Depois abrigou outros departamentos da Polícia Civil. Até ser desativado no governo Pimentel para ser A Casa da Liberdade, acolhendo concomitantemente o Memorial dos Direitos Humanos. Cabe agora ao governador Romeu Zema instalar o Memorial, ainda mais agora quando se celebram os 40 anos da Anistia, justamente ontem, quarta feira, dia 28 de agosto. Mas a comemoração será hoje às 17 horas, em frente ao antigo DOPS, na Afonso Pena, com uma grande manifestação. Na verdade, não há o que comemorar. A anistia foi uma espécie de “passa o pano” no passado. Ninguém foi punido pelos excessos do regime, muitos mortos ainda estão desaparecidos, de forma que a manifestação de hoje não tem mesmo o sentido da comemoração nem da celebração. Será uma espécie de choro aos mortos e aos que não tiveram direito ao velório ou à sepultura digna – como foi o caso da família Mata Machado, de Belo Horizonte, que não pode sequer abrir o caixão onde jazia o corpo do estudante José Carlos Mata Machado.