Por Estado de Minas
Um dia após ser alvo de recorrentes críticas do governador mineiro Romeu Zema (Novo) na TV Globo, nessa terça-feira (27/9), o ex-governador Fernando Pimentel (PT) crê que o sucessor escolheu mencioná-lo a fim de “fugir do debate” a respeito da atual administração. Ontem, em entrevista ao Estado de Minas, Pimentel afirmou que Zema faz gestão “medíocre”.
“Apesar da receita fabulosa, ele não fez nada por Minas. Não existe uma política pública, um programa ou uma obra. Ele está, simplesmente, pagando a folha no quinto dia útil. É um governo que não tem nada a mostrar aos mineiros. Justamente por não ter nada a mostrar, se remete a três anos e meio atrás, como se o que estivesse em julgamento fosse meu mandato”, disse.
O petista se defendeu das críticas e relacionou os problemas financeiros do estado aos herdados por ele. “A crise fiscal de Minas é antiga e veio se acumulando nos governos que me antecederam, especialmente nos três governos do PSDB, e continua. A origem da crise é a previdência pública”, assegurou.
Pimentel falou ainda a respeito da postura do PT ante Zema e afirmou que o partido não conseguiu verbalizar, à opinião pública, uma orientação de oposição clara ao modelo do partido Novo. “Zema conseguiu fazer um governo, praticamente, sem sofrer críticas contundentes por parte do mundo político e da imprensa. Ele navegou em um céu de brigadeiro”, protestou.
Como o senhor recebeu as recorrentes citações de Zema a seu nome durante o debate da TV Globo?
Ele já tem feito isso e está utilizando essa tática que acredito ser uma recomendação que recebeu de marqueteiros ou algo assim. Mas acho que ontem (anteontem) ele exagerou. Ficou meio ridículo, no fim das contas. Os próprios candidatos que estavam no debate se queixaram disso. Um deles (Marcus Pestana, do PSDB) chegou a sugerir de, quem sabe, Kalil dar meu telefone a ele. O debate era sobre o governo do estado, o governo dele, que é governador há três anos e meio. Meu governo, que ele insiste em puxar o assunto, terminou três anos e meio atrás. Ele escolhe o caminho de comentar e criticar meu governo, justamente, como método de fugir do debate sobre o governo dele, que está em julgamento.
Qual sua opinião sobre o governo Zema?
É um governo medíocre, para dizer o mínimo. Ruim para Minas Gerais. É um governo que tem condições financeiras muito melhores do que as que tive. Governei o estado em situação financeira muito ruim. E, também, em uma situação política delicadíssima – a maior crise da República até este momento foi naquele período, com o impeachment de Dilma e a famigerada Operação Lava-Jato, que levou à absurdamente injusta prisão de Lula, em um processo fraudulento movido por (Sergio) Moro.
Zema não tem nada desses problemas. Ele está governando o estado com sobras de caixa. Em 2016, 2017 e 2018, o estado arrecadou R$ 264 bilhões. Em 2019, 2020 e 2021, arrecadou R$ 303 bilhões. É uma diferença de quase R$ 40 bilhões. Somado ao que ele deixou de pagar da dívida com a União – cerca de R$ 20 bilhões -, ele tem R$ 64 bilhões a mais em caixa. Isso explica porque regularizou as contas e colocou os salários em dia.
Apesar da fabulosa receita, ele não fez nada por Minas. Não existe uma política pública, um programa ou uma obra. Ele está, simplesmente, pagando a folha no quinto dia útil. É um governo que não tem nada a mostrar aos mineiros. Justamente por não ter nada a mostrar, se remete a três anos e meio atrás, como se o que estivesse em julgamento fosse meu mandato.
O senhor considera justo ser responsabilizado por ele pela crise fiscal que se abateu sobre Minas Gerais?
Não. A crise fiscal de Minas é antiga e veio se acumulando nos governos que me antecederam, especialmente nos três governos do PSDB, e continua. A origem da crise é a previdência pública. Temos, em Minas, uma folha de pagamento muito pesada dos aposentados. Na minha época, no que Minas arrecadava versus no que gastava, sem a previdência, o estado era superavitário em cerca de R$ 8 bilhões. Mas há a folha de aposentados: pagávamos cerca de R$ 22 bilhões ao ano e arrecadávamos, de fonte previdenciária, com os salários da ativa e (contribuição) patronal, pouco mais de R$ 5 bilhões. Ficava faltando.
Você colocava os R$ 8 bilhões de superávit na folha, mas faltavam R$ 8 bilhões ou R$ 9 bilhões todo ano. E isso era crescente, porque, anualmente, aumentava a quantidade de aposentados. Esse desequilíbrio não está resolvido. Isso envolve grande negociação com a União e a criação de um fundo previdenciário capitalizado pelo estado pela União. É uma discussão longa e complexa, que não foi feita. Não tive tempo para fazer isso. Foi um governo muito tumultuado. O PSDB teve 16 anos no governo e poderia ter resolvido a questão.
Zema simplesmente ignora isso. Está com dinheiro em caixa, pois não paga a dívida com a União e tem excesso de arrecadação, mas essa verba não serve para resolver o problema previdenciário ou para fazer obras e políticas públicas importantes.
Quando esteve em Ipatinga, na semana passada, Lula disse que a única coisa que vê Zema fazer é criticar o PT. Ele, inclusive, pediu que a direção do partido em Minas respondesse aos ataques. O que é possível fazer?
O que o presidente quis dizer naquele momento era que caberia ter tido uma resposta ao longo dos três anos de governo Zema, por parte do PT, às críticas que ele tem feito reiteradamente, desde que assumiu o governo. Infelizmente, vamos reconhecer, não houve oposição a Zema na Assembleia Legislativa, de maneira geral, na cena pública.
Não obstante o fato de que perdi a eleição, o PT elegeu a maior bancada de deputados da Assembleia. E, por algum motivo que não sei explicar, porque não sou deputado, não foi feita oposição. Ao não fazer oposição, o partido, então, ficou desabrigado em relação a essas críticas. Eu, como ex-governador, não tinha como retrucar, porque não tinha mandato e voz pública para isso – vou ter agora, se for eleito deputado federal.
O que Lula estava querendo dizer é que o PT deveria ter feito a defesa do nosso mandato. Não fez. Agora, na campanha, certamente esse tema vai voltar. E é hora, sim, não só do PT, mas da campanha de nossa coligação, enfrentar as críticas e rebatê-las à altura.
Que fato ilustra sua opinião sobre o PT não ter feito oposição concreta a Zema na Assembleia?
O partido, como um todo, claramente era de oposição a Zema, mas isso não foi verbalizado de maneira eficiente à opinião pública. Então, Zema conseguiu fazer um governo, praticamente, sem sofrer críticas contundentes por parte do mundo político e da imprensa. Ele navegou em um céu de brigadeiro. É isso que dá a ele a aprovação que as pesquisas mostram que, aparentemente, o governo tem. Foi um governo que não teve oposição.
O senhor, recentemente, ganhou a chance de utilizar, como direito de resposta, 1 minuto do tempo de TV de Zema. O que pretende veicular?
Ganhei três direitos de resposta sobre mentiras que ele falou no programa eleitoral sobre meu mandato e sobre mim. Esse, a que você (repórter) se refere, diz respeito ao Palácio das Mangabeiras. Ele veiculou no programa dele (uma peça) como se utilizar a residência oficial fosse um crime, me qualificando como ‘rei’ e ‘faraó’. A residência oficial foi utilizada por todos os 17 governadores desde Juscelino Kubitschek. Ela está lá para isso. Não é uma mordomia, um palácio, mas um local de trabalho preparado para isso. O governador atua 24 horas por dia, 365 dias ao ano.
Zema quis pintar isso como uma coisa quase criminosa. A Justiça determinou que ele me desse um minuto do tempo dele, que deve ir ao ar amanhã (hoje). Vou explicar que não há nada de errado (em usar o Palácio das Mangabeiras) e que não tinha 30 empregados. Os funcionários que lá estão são públicos e trabalham em um complexo de governo – não prestando serviços domésticos. Fico surpreso em ver o que ele fez agora com a residência oficial das Mangabeiras: cedeu, sem licitação, para um grupo de empresários, uma entidade privada, que utiliza o espaço cobrando ingresso para entrar. É um bem público. Uma entidade privada cobrar ingresso em patrimônio público, até onde entendo, é uma infração grave.
Como o senhor avalia a postura de Zema no debate?
Não sei explicar por que ele adotou esse caminho (de criticar Pimentel). É um caminho que me beneficia, porque ele está me tornando protagonista de uma eleição em que não sou candidato a governador – mas a deputado federal. Ele traz meu nome ao programa eleitoral das candidaturas majoritárias eleitorais e ao debate. Me torna protagonista e me dá evidência em um momento em que não era necessário. Para mim, não é ruim.
Ele está ingressando em um território perigoso. A crítica recorrente ao PT pode ser que não dê muito certo em um estado onde Lula, principal liderança do partido, tem quase 50% de preferência popular nas pesquisas. O governador está se indispondo publicamente com metade da população mineira, que aprova e está disposta a votar em Lula – e, obviamente, aprova nosso partido.
Foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press