Por O Tempo
Os diretórios do PSOL em Minas e em BH entraram com duas ações na Justiça Eleitoral denunciando suposta fraude à cota de gênero nas chapas do PROS e do PRTB na eleição municipal para a Câmara Municipal de Belo Horizonte. Segundo a presidente do PSOL no Estado, Maria da Consolação Rocha, ambos os partidos denunciados teriam utilizado candidaturas laranja para atingir a cota mínima de 30% de mulheres na chapa.
“É uma ação de investigação judicial eleitoral em relação ao PROS e ao PRTB porque nós temos uma tradição, o PSOL, de garantir a efetiva participação feminina”, disse a dirigente. As ações foram propostas juntamente com a Associação Visibilidade Feminina no último dia 15 de dezembro.
Ainda conforme a denúncia, sem as supostas candidatas fictícias, “os partidos não poderiam ter registrado a chapa com a quantidade de candidatos masculinos desejado”, conforme prevê a Lei nº 9.504/1997, que estabelece as normas para as eleições.
“O que nós observamos foi que não foi apresentada prestação de contas de algumas candidatas, a maioria teve menos de cinco votos e teve uma que zerou votos, fizeram campanha para outros candidatos. Por isso, entramos com esse processo, com um pedido de investigação para apurar porque já tivemos aqui em Minas Gerais a situação de candidaturas laranja e decidimos continuar vigilantes nesses casos”, disse a presidente do PSOL Minas.
No caso do PRTB, a denúncia dá conta de que quatro candidatas registraram uma votação mínima, “entre zero e seis votos, além de não registrarem arrecadação de recurso ou despesa eleitoral na prestação de contas. Além disso, não há qualquer indício de realização de campanha eleitoral para suas candidaturas”.
Ainda conforme o PSOL, a documentação juntada demonstra que todas as quatro candidatas manifestaram apoio em suas redes sociais ao candidato Alex Gasparzinho, “participando de diversos atos de campanha documentados em vídeos e fotos, agindo na realidade como cabos eleitorais do candidato”.
Já no caso do PROS, a acusação é de que foram apresentadas oito candidatas fictícias que obtiveram entre zero e oito votos. Também nenhuma delas registrou recursos ou gastos eleitorais e não teriam feito campanha eleitoral. Mas, duas delas teriam feito propaganda em suas redes sociais para o candidato reeleito Wesley Autoescola.
Se comprovada a denúncia, a Justiça Eleitoral pode cassar a chapa de vereadores de cada um dos partidos, e anular os votos. Esse foi o entendimento da Corte em um caso semelhante no ano passado, quando a Justiça Eleitoral cassou o mandato de seis vereadores eleitos em uma mesma chapa para a Câmara de Valença do Piauí (PI) após comprovação de que houve fraude à cota de gênero. O mesmo entendimento foi adotado em decisões posteriores, inclusive ao longo deste ano.
Se isso acontecer, o segundo vereador mais votado de Belo Horizonte, Nikolas Ferreira (PRTB), pode ter o mandato cassado. Ele teve 29.388 votos, que seriam anulados, caso se comprove a denúncia de candidaturas laranja na chapa do partido e o entendimento da Justiça siga a jurisprudência. O mesmo pode acontecer ao vereador reeleito do PROS, Wesley Autoescola, que teve 4.950 votos
Nesse caso, segundo o professor de Direito Eleitoral da PUC Minas e da Faculdade Arnaldo e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral, João Andrade, os votos destinados às chapas cassadas são anulados, e o quociente eleitoral é recalculado, abrindo novas cadeiras na Câmara. Nesse caso, o PSOL pode ser beneficiado já que a primeira suplente na eleição para a Câmara deste ano é a atual vereadora pelo partido, Cida Falabella, que teve 6451 votos, mas não se reelegeu.
Procurada, a presidente do PRTB em Minas Gerais, Rita Del Bianco, não respondeu às mensagens enviadas ao seu celular e também não atendeu às ligações. Já o vereador eleito Nikolas Ferreira disse que está acompanhando o caso e que seus advogados já apresentaram defesa. “Uma das melhores teses que nós temos de defesa é que eu bati o quociente sozinho, então, de fato eu não precisei, inclusive, da chapa para me eleger. E completou: “Isso é mais uma tentativa da esquerda de tentar obstruir a minha candidatura, fazer com que o conservador não seja ouvido”, disse.
Questionado sobre as procedência das denúncias, o vereador disse não ter informações sobre a formação da chapa do PRTB. “Aquilo que diz respeito à formação de chapa é com o partido. Então, quem for responsabilizado, obviamente, não deve ser o candidato. Eu não respondo pela direção do partido”, emendou.
A reportagem também procurou a presidência do PROS em BH, que não se pronunciou. Já o presidente do partido em Minas, deputado federal Eros Biondini disse que não acompanhou “e sinceramente não tenho noção da construção da chapa”. Mas, disse que não acredita “que tenha havido qualquer irregularidade”.O vereador reeleito Wesley da Autoescola também não respondeu.
Em nota, o TRE-MG confirmou que “se forem comprovadas irregularidades quanto à cota de gênero, a sentença pode, sim, culminar na cassação da chapa e dos eleitos, situação em que os votos seriam anulados”.
Outras denúncias
Além das denúncias apresentadas pelo PSOL, o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) já recebeu uma denúncia da Rede contra o PRTB e outra contra o PROS, e uma terceira contra o PROS, apresentada pelo atual vereador Edmar Branco (PSB). Ele foi o nono vereador mais votado na eleição, com 8.103 votos, mais do que muitos do vereadores eleitos. Mas, ficou fora pois seu partido não atingiu o quociente eleitoral, de 30.189 votos, o que garantiria uma vaga para a legenda na Câmara.
Branco informou que seu partido, o PSB, já havia entrado com uma ação contra o PROS e PSC, mas ambas teriam sido arquivadas. Agora, o próprio vereador ingressou com nova ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) contra o PROS. “Eu entrei de novo questionando a chapa toda porque eu acho que está bem claro que, se você é candidato, e você mesmo não vota em você, e principalmente as mulheres, isso é um problema sério”, disse.
Caso essa nova ação seja validada, as denúncias comprovadas e a chapa cassada, o vereador também pode ser beneficiado, conforme ficar o resultado do novo quociente eleitoral.
Além disso, o TRE-MG informou que tem “conhecimento de que teriam sido apresentadas denúncias sobre o tema ao Ministério Público Eleitoral, que estaria conduzindo investigações. Mas o MP ainda não apresentou nenhuma ação com questionamentos sobre descumprimento da cota de gênero”.
Jurisprudência
Em 2018, o Tribunal Superior Eleitoral aprovou uma resolução em 2018 definindo um mínimo de 30% de recursos para as candidaturas femininas e, no ano passado, acrescentou à medida a obrigatoriedade de que esse percentual acompanhe o percentual de candidatas do partido. Ou seja, se uma legenda lançar mais do 30% de mulheres, deve direcionar valor proporcional às suas campanhas.
No entanto, em decisão deste ano, o Supremo também se posicionou em relação a três mulheres que disputaram uma vaga de vereadora em Pedro Laurentino (PI) com entendimento de que candidaturas que não tenham tido nenhum voto nem tenham movimentado recursos não necessariamente são “laranja”.
Foto: DENILTON DIAS/O TEMPO – 3.7.2017