Por Carlos Lindenberg
O governador Romeu Zema foi bem mais cuidadoso, para não dizer sensato, do que o presidente Jair Bolsonaro. Enquanto o governador de Minas cuidou logo de se ausentar da Cidade Administrativa, ao tomar conhecimento de que um dos seus circunstantes da semana passada estava positivo para o coronavírus, o presidente Bolsonaro espargia o “mal do século” entre alguns de seus seguidores – ele que ainda estava à espera, domingo, de um novo exame e, portanto, sujeito a ser portador do vírus da morte – e saiu do isolamento, certamente imposto pelo seu médico, para se confraternizar com manifestantes que protestavam contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, contrariando até mesmo o ministro da Saúde, Luiz Mandetta, que havia se insurgido contra a aglomeração de pessoas na eclosão dessa pandemia.
A favor de Zema deve-se dizer, ainda, que ele preferiu descer as escadas, para evitar a contaminação do elevador, e se colocou de imediato sob isolamento doméstico à espera do resultado dos exames que deveriam sair nessa terça-feira. Um comportamento, como se vê, bem diferente do presidente da República que desautorizou seu ministro da Saúde e ainda ontem repetia que o país não pode viver nessa histeria em que está o resto do mundo. Ao ouvir isso, a impressão que se tem é que Bolsonaro acha que ele é imortal, mesmo levando-se em conta, de fato, que ele escapou por pouco da facada que lhe desferiu o surtado Adélio Bispo, ano passado, em Juiz de Fora – Bolsonaro, aliás, até hoje acha que foi alguém que mandou Adélio mata-lo.
Mas quem esteve com o governador Romeu Zema, na semana passada, já que ele disse numa nota que se encontrou com alguém que lhe confessou, depois, que estava infectado e, que por isso, ele saiu rápido da Cidade Administrativa? Na verdade, apesar da discrição do governador, ele esteve com duas pessoas infectadas pelo coronavírus na semana passada. Primeiro, na quinta-feira, ele recebeu no seu gabinete o presidente da Federação das Indústrias, Flavio Rosco. E no dia seguinte esteve com o vereador Gabriel Azevedo, na festa de aniversário do novo secretário Matheus Simões. Os dois, Flávio e Gabriel, são portadores do coronavírus, descobriu-se ontem, segunda-feira, no caso de Flávio, e hoje, terça, no caso de Gabriel. Ou seja, o governador Romeu Zema pode até não ser um portador do coronavírus, mas esteve duas vezes exposto ao ataque do vírus que está assustando o mundo e obrigando os quatro continentes às mais rigorosas medidas sanitárias – apesar de Bolsonaro ainda achar que é um alarme desmedido, mesmo já tendo ontem alguns economistas prevendo crescimento zero ou negativo para o país neste ano.
No caso do presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, ele contraiu a doença na viagem que fez com Bolsonaro aos Estados Unidos, na semana passada. Ele e o presidente da Confederação Nacional da Indústria, o também mineiro Robson Braga de Andrade. Dessa viagem nada menos de 14 pessoas voltaram infectadas. Já o vereador Gabriel Azevedo provocou ontem uma certa indignação entre seus pares e dos funcionários da casa porque, embora só soubesse nesta terça-feira que está infectado, ele participou normalmente das festividades da filiação no Podemos, frequentou a reunião de segunda-feira na Câmara Municipal, ainda que já estivesse aguardando o resultado dos exames, mesmo assintomático. De forma que ontem ele estava sendo execrado na Câmara, onde se dizia que ao fazer os exames ele deveria proceder como fez Romeu Zema, que rumou para casa e se manteve cumprindo as normas da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde do Brasil, o mesmo que foi desautorizado pelo presidente Jair Bolsonaro, domingo. Aliás, ontem, Bolsonaro foi questionando ao sair do Alvorada por um imigrante haitiano que o desafiou a deixar a presidência da República por estar, no dizer do haitiano, contaminando o povo brasileiro, sendo apupado pelos correligionários do presidente que sempre o esperam na saída de sua residência oficial, de manhã ou à noite. A propósito, ontem, foi apresentado pelo deputado distrital Leandro Grass (Rede-DF) o pedido de impeachment do presidente Jair Bolsonaro por ter participado ou endossado as manifestações contra o Congresso e o STF, domingo, quebrando ainda a recomendação do ministro da Saúde, Luiz Mandetta. São pequenas as chances de um pedido desses ir adiante, até porque o Congresso nessa quadra está querendo fazer as reformas que o governo pede – ainda que os projetos ainda estejam no executivo. A deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP), que assinou o pedido de impeachment da então presidente Dilma, foi mais direta: pediu a renúncia de Bolsonaro por crime contra a saúde pública.
Foto: Pedro Gontijo/ Imprensa MG