Por G1
A partir do meio dia desta quarta-feira (20), a Casa Branca tem um novo inquilino. Joe Biden faz seu juramento como o 46º presidente dos Estados Unidos e, com isso, recebe o direito de ocupar a sede da presidência e a residência oficial.
Já o atual morador, Donald Trump, se não tiver deixado a casa até essa data limite – e se recusar a sair de forma voluntária –, pode ser considerado um invasor e ir escoltado para fora por agentes de segurança.
Membros aposentados do Serviço Secreto chegaram a dizer à revista americana “Vanity Fair” que, se não sair, Trump pode ser expulso, e até mesmo ser acusado e responder pelo crime de invasão – como qualquer cidadão comum.
“Isso dificilmente vai acontecer”, disse em entrevista ao G1 o professor de relações internacionais da Faap (SP), Carlos Gustavo Poggio. “Claro que nada é impossível vindo do Trump, mas acho que ele não se sujeitaria a esse tipo de coisa.”
Para o especialista em protocolos de posse presidencial, Jorge Francisco Santiago, o republicano deve deixar a Casa Branca dias antes da cerimônia oficial. Para ele, qualquer boato de que ele se recusaria a abandonar a residência oficial “faz parte da retórica de Trump”.
“Ele sempre quer chamar a atenção, das pessoas, dos meios, sempre indo contra a maré”, disse o professor de comunicação política da Universidade Camilo José Cela, de Madri. “É parte do espetáculo, o senhor Trump vai abandonar a Casa Branca antes da posse.”
Tudo é tradição
Não existe nenhuma obrigação de que Trump deixe a Casa Branca antes do prazo determinado pela Constituição americana – às 12 horas do dia 20 de janeiro – reforçaram os especialistas. No entanto, a transferência de poder nos EUA é cercada por rituais e tradições.
“Essas questões do processo de transição, nos EUA, são governadas pela tradição, e não tanto pela legislação”, disse Poggio. “Uma delas já foi quebrada por Trump, que foi a tradição de o candidato derrotado ligar para o candidato vencedor e dar os parabéns.”
Já o especialista em protocolos lembrou que, neste ano, a posse acontece em um cenário inédito: com um segundo impeachment de Trump votado pela Câmara e o aumento da violência dos apoiadores do presidente, que no início do mês invadiram Capitólio dos EUA.
“Há uma demonstração de força”, disse Santiago. “Washington DC está se preparando com a Guarda Nacional, com soldados do Exército, é uma coisa histórica. O ritual, que era para ser festivo, se tornou em um ato de temor e medo.”
Transição atrapalhada
O professor da Faap classifica a transição entre os governos Biden e Trump como “a pior da história recente”. Trump chegou a dizer, na semana passada e pela primeira vez, que ela seria feita de forma “ordenada” – isso depois de passar mais de dois meses questionando a vitória de Biden.
Poggio comentou que, em tempos normais, enquanto o staff – funcionários do governo – esvaziam suas gavetas, se preparando para sair, os indicados por Biden já começariam a fazer reuniões com os secretários ainda que a autoridade legal do democrata passe a valer só a partir de 20 de janeiro.
Mas muitos se demitiram a uma semana do fim do governo, deixando seus gabinetes sob o comando de chefias interinas.
“Não vejo como uma transição ordenada”, disse Poggio. “Acho que é uma transição que tem bastante falhas principalmente num momento de pandemia. Já há alguns relatos de que as equipes não receberam tudo o que têm que receber e houve um atraso muito grande.”
Ele explicou que o tempo de transição costuma ser mais longo, em condições normais, quando um presidente assume a derrota ainda em novembro. Segundo ele, o comportamento de Trump, que se recusava a aceitar os resultados legítimos das eleições, atrapalhou a transição.
“Essas são coisas que a gente não costumava ver nos EUA, porque a gente tratava esse processo de transição presidencial como algo banal, mas em algum momento quando você tem um presidente com instintos ditatoriais no poder, as instituições passam a ser testadas”, disse Poggio.
Juramento e fim
O único requisito legal que deve ser cumprido, disse Poggio, é o juramento que o presidente eleito deve fazer antes de assumir o cargo. No entanto, não há nenhuma obrigatoriedade de onde ele deve ser feito – seja no Capitólio, ou na casa de Biden, por exemplo.
O 36º presidente, Lyndon B. Johnson, jurou a bordo do avião presidencial Air Force 1 hora depois que o então presidente John F. Kennedy foi assassinado. Também não é obrigatória a presença do seu antecessor – e Trump já disse que não vai estar presente durante a cerimônia.
“É um ritual, que não está escrito, mas tradicional, que o presidente acompanhe os novos moradores à Casa Branca”, disse Santiago. “Eu acredito que não ir mostra uma falta de responsabilidade de Trump. Ele é o presidente dos EUA e todos os cargos vêm com ‘cargas’ para se carregar, ainda que não queira.”
Foto: Cheriss May/Arquivo/Reuters